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sábado, 2 de agosto de 2025

Romeu e Julieta: O Papel Ambíguo da Ama na Tragédia de Shakespeare

A ilustração mostra uma cena da peça de Shakespeare, "Romeu e Julieta", com foco na complexa relação entre Julieta e sua Ama.  A Ama, uma mulher de semblante robusto, está no centro da cena. Sua expressão facial e sua postura corporal sugerem um tom de comédia e familiaridade, mas há uma ambiguidade sutil em seu sorriso e na maneira como ela gesticula em direção a uma jovem Julieta. A expressão de Julieta é de expectativa e seriedade, contrastando com o pragmatismo da Ama.  A cena se passa num quarto, com a luz suave de uma janela iluminando as duas figuras, destacando a dinâmica entre a inocência da jovem e a natureza mais complexa e mundana de sua confidente. A imagem capta a essência da personagem: uma figura que oferece tanto apoio quanto conselhos duvidosos, representando a dualidade de sua lealdade.

Poucas obras na história da literatura ecoam com a força e a atemporalidade de Romeu e Julieta, de William Shakespeare. A trágica história de amor proibido entre os jovens de Verona cativa o público há séculos. No entanto, para além do casal protagonista e do ódio entre as famílias Montecchio e Capuleto, um personagem secundário se destaca por sua complexidade e influência na trama: a Ama de Julieta.

Muitos a veem apenas como um alívio cômico, mas uma análise mais profunda revela uma figura com um papel crucial e uma lealdade ambígua. Este artigo explora as camadas da Ama, seu humor irreverente e a dualidade de suas ações que, por um lado, apoiam o amor dos jovens e, por outro, contribuem para o desfecho trágico.

A Ama como Alívio Cômico: O Sabor do Povo em Verona

A primeira impressão que temos da Ama é a de uma figura folclórica, tagarela e desinibida, que contrasta drasticamente com a solenidade do ambiente da casa Capuleto. Suas falas repletas de anedotas, piadas obscenas e digressões sobre o passado de Julieta servem como um bem-vindo alívio cômico na crescente tensão da peça.

  • Linguagem Popular: A Ama fala em prosa, com uma linguagem simples e direta, o que a diferencia dos nobres que se expressam em versos. Essa escolha de Shakespeare a posiciona como uma representante da classe trabalhadora, com uma visão de mundo mais pragmática e menos idealizada que a dos jovens amantes.

  • A Confidente: Apesar de sua informalidade, a Ama é a figura mais próxima de Julieta. Ela a criou desde pequena e é a única pessoa a quem a jovem pode confiar seus segredos mais profundos. A Ama é a ponte entre a inocência de Julieta e as realidades do amor e do desejo.

Lealdade ou Oportunismo? A Ambiguidade das Ações da Ama

Apesar de seu papel cômico, a lealdade da Ama é a característica mais intrigante e complexa do personagem. Ela é, inicialmente, a principal cúmplice do romance secreto entre Romeu e Julieta. É ela quem leva as mensagens, arma o encontro secreto para o casamento e, com seu humor e bravata, incentiva o amor dos jovens.

No entanto, a sua lealdade começa a se dissolver no momento em que as coisas se complicam. Quando Romeu é exilado após matar Tebaldo, o primo de Julieta, a Ama se mostra pragmática e, de repente, sugere que Julieta se case com o Conde Páris. A sua justificativa é simples: Páris é um bom partido, e Romeu está longe e provavelmente nunca mais voltará.

  • A Mudança de Postura: Essa reviravolta na lealdade da Ama é chocante e, para muitos, uma traição. Ela trai a confiança de Julieta ao propor o casamento com Páris, o que leva a jovem a uma desesperadora situação.

  • Motivações da Ama: A mudança de postura pode ser interpretada de diferentes maneiras. A Ama pode estar agindo por medo, temendo as consequências de desafiar a vontade do Senhor e da Senhora Capuleto. Ou talvez, sua lealdade nunca tenha sido verdadeira, mas sim uma forma de se divertir com o romance dos jovens e, ao mesmo tempo, manter seu lugar na casa dos Capuleto. A tragédia se instala, e o idealismo dos jovens se choca com o pragmatismo e o medo da Ama.

O Fim da Lealdade e o Início da Tragédia

O conselho da Ama para que Julieta se case com Páris marca um ponto de não retorno na trama. A partir desse momento, Julieta perde sua única aliada e se isola completamente. Ela é obrigada a procurar o Frei Lourenço e a recorrer ao plano desesperado de fingir a própria morte, que, como sabemos, culmina na morte dos dois amantes. A decisão da Ama de aconselhar o casamento com Páris não é a causa direta da tragédia, mas é um catalisador que empurra Julieta para a sua inevitável ruína.

Em última análise, a Ama é uma personagem que reflete a complexidade da condição humana. Ela é engraçada, atenciosa e, por um tempo, a confidente leal de Julieta. Mas, quando a realidade se torna perigosa, ela se curva à conveniência e ao pragmatismo, abandonando a jovem em seu momento de maior necessidade. A sua ambiguidade nos lembra que, mesmo nas maiores histórias de amor, a lealdade pode ser frágil e as intenções, nem sempre puras.

(*) Notas sobre a ilustração:

A ilustração mostra uma cena da peça de Shakespeare, "Romeu e Julieta", com foco na complexa relação entre Julieta e sua Ama.

A Ama, uma mulher de semblante robusto, está no centro da cena. Sua expressão facial e sua postura corporal sugerem um tom de comédia e familiaridade, mas há uma ambiguidade sutil em seu sorriso e na maneira como ela gesticula em direção a uma jovem Julieta. A expressão de Julieta é de expectativa e seriedade, contrastando com o pragmatismo da Ama.

A cena se passa num quarto, com a luz suave de uma janela iluminando as duas figuras, destacando a dinâmica entre a inocência da jovem e a natureza mais complexa e mundana de sua confidente. A imagem capta a essência da personagem: uma figura que oferece tanto apoio quanto conselhos duvidosos, representando a dualidade de sua lealdade.

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