A literatura brasileira é rica em grandes nomes e obras que desafiam o leitor a pensar, a sentir e a questionar. Entre esses gigantes, Rubem Fonseca ocupa um lugar especial, e seu livro O Doente Molière é um exemplo perfeito de sua genialidade. Publicado em 2000, este romance não é apenas uma biografia, mas uma imersão na mente de um dos maiores escritores de nossa época, que utiliza a figura de Molière para explorar temas atemporais como a arte, a doença, a vida e a morte.
Neste artigo, vamos desvendar as camadas de O Doente Molière, explorando por que essa obra se tornou um marco na carreira de Rubem Fonseca e na literatura contemporânea. Prepare-se para uma jornada que vai muito além das páginas, mergulhando na essência da escrita fonsequiana.
O Enigma de Rubem Fonseca: Um Mestre da Narrativa
Rubem Fonseca é conhecido por sua prosa seca, direta e implacável. Ele não poupa o leitor de cenas violentas, diálogos cortantes e personagens complexos que transitam entre a criminalidade e a intelectualidade. Sua escrita é um espelho da realidade brutal das grandes cidades, mas também um mergulho profundo na psique humana. O Doente Molière é um testemunho de seu domínio da narrativa, onde a ficção se mistura com a realidade de forma quase indissociável.
Ele foi um dos expoentes da "Geração de 45" e, posteriormente, do que ficou conhecido como "literatura de combate", sempre com um olhar crítico sobre a sociedade. Seus contos e romances, como "Feliz Ano Novo" e "Agosto", chocaram e encantaram, consolidando-o como uma voz indispensável. Em O Doente Molière, Fonseca utiliza um cenário histórico para discutir questões que ecoam em nosso presente, mostrando sua relevância contínua.
A Estrutura e a Essência de O Doente Molière
O livro O Doente Molière se destaca por sua estrutura não-linear e fragmentada. A narrativa não segue uma cronologia rígida, mas se desenvolve através de episódios, anotações, cartas e reflexões, criando um mosaico que reflete a complexidade da vida de Molière e do próprio narrador. Fonseca brinca com o tempo e a voz, alternando entre a terceira pessoa e a primeira, e misturando a história do dramaturgo com a do próprio narrador.
Molière: O Homem, o Artista, o Doente
O personagem principal, Jean-Baptiste Poquelin, o Molière, é retratado em seus últimos dias, lutando contra a tuberculose. A doença não é apenas um pano de fundo, mas uma metáfora para a fragilidade da vida e a perseverança da arte. Molière, mesmo debilitado, continua a escrever e a atuar, provando que a arte é a sua própria razão de ser. Fonseca explora o paradoxo do gênio que, apesar de ridicularizar a hipocrisia e a medicina de sua época em suas peças, se vê aprisionado em um corpo que falha.
A crítica à hipocrisia: A obra de Molière é marcada por uma crítica ferrenha aos costumes e à hipocrisia da sociedade. Em O Doente Molière, Rubem Fonseca resgata essa faceta do dramaturgo, mostrando como sua arte era uma forma de combate.
O teatro como salvação: Para Molière, o palco é o lugar onde ele encontra sua verdadeira identidade. É no teatro que ele se liberta de sua dor e de seu sofrimento, transformando-os em arte.
A dualidade entre a vida e a arte: Fonseca mostra a difícil conciliação entre o homem real, com suas fraquezas e medos, e o artista, que se eterniza em sua obra. A doença é o elo que conecta esses dois mundos, tornando-os inseparáveis.
O Narrador: A Voz que Conecta Mundos
Um dos elementos mais intrigantes de O Doente Molière é a presença do narrador, que se identifica como um escritor brasileiro. Ele pesquisa a vida de Molière para escrever um romance, mas sua obsessão pelo dramaturgo o leva a uma imersão profunda, misturando sua própria vida com a do personagem. O narrador se questiona sobre a natureza da criação, a validade da ficção e a influência do passado sobre o presente. Ele se torna uma espécie de detetive literário, buscando pistas em documentos históricos, anotações de Molière e relatos de seus contemporâneos.
Um Mosaico de Temas
Para entender a profundidade de O Doente Molière, é fundamental explorar os temas que o autor tece ao longo da narrativa. As palavras-chave a seguir ajudam a traçar um mapa do universo fonsequiano:
Rubem Fonseca: A escrita de Fonseca é um estilo à parte, marcado por sua concisão, seu humor ácido e sua visão cética da humanidade.
Literatura brasileira: O livro se insere em um contexto literário mais amplo, dialogando com autores como Machado de Assis (outra figura que explorou a ironia e a crítica social) e com as novas formas de escrita contemporânea.
Molière: A figura histórica de Molière é o ponto de partida para a reflexão sobre a arte e a vida.
Doença: A tuberculose de Molière não é apenas um fato biográfico, mas uma metáfora para a fragilidade da existência.
Arte e criação: O livro questiona os limites entre a vida e a obra, mostrando como a criação artística é uma forma de enfrentar a morte.
Perguntas Frequentes Sobre O Doente Molière
O Doente Molière é uma biografia de Molière? Não, não é uma biografia no sentido tradicional. Embora Rubem Fonseca se baseie em fatos históricos da vida de Molière, o livro é uma obra de ficção que usa o dramaturgo como ponto de partida para uma reflexão sobre a criação, a arte e a condição humana.
Qual é o estilo de Rubem Fonseca no livro? O estilo é tipicamente fonsequiano: conciso, fragmentado e com uma prosa seca e direta. Ele mistura a ficção com o real de forma sutil, desafiando o leitor a distinguir entre os fatos e a imaginação do narrador.
Por que o livro é considerado uma obra-prima? O livro é aclamado pela crítica por sua complexidade, sua linguagem inovadora e sua capacidade de abordar temas profundos de forma acessível. A forma como Fonseca interliga a vida de Molière com a do narrador cria uma metalinguagem que enriquece a leitura e a torna uma experiência única.
Por que Ler O Doente Molière Hoje?
Em um mundo onde a superficialidade muitas vezes prevalece, a leitura de O Doente Molière é um convite à reflexão profunda. Rubem Fonseca nos força a confrontar questões essenciais sobre o que significa ser humano, a importância da arte e o legado que deixamos. Ele nos mostra que a arte é uma forma de resistência, um meio de transcender a dor e a efemeridade da vida.
A obra é um lembrete de que a genialidade muitas vezes nasce da dor, e que a criação é um ato de coragem. Ao ler O Doente Molière, o leitor não apenas conhece mais sobre o dramaturgo francês, mas também se aprofunda na mente de Rubem Fonseca, um dos maiores nomes da literatura brasileira. A obra é uma experiência transformadora, um romance que nos faz pensar, sentir e, acima de tudo, admirar a capacidade humana de criar beleza mesmo nas circunstâncias mais difíceis.
A ilustração apresenta o dramaturgo Molière em um cenário que evoca tanto o teatro quanto sua doença. O artista está no centro da imagem, em pé sobre um palco, mas a cena sugere uma solidão profunda.
Ele está vestido com a indumentária clássica da época, incluindo um casaco com babados e uma peruca, mas sua aparência é de extrema fragilidade. Seu rosto está pálido e cansado, e uma das mãos está pressionada contra o peito, um gesto que remete à sua luta contra a tuberculose. Molière se apoia em uma bengala, indicando a fraqueza física que o acompanhou em seus últimos dias.
O palco, com suas cortinas pesadas e o cenário de fundo, cria a atmosfera teatral, mas a ausência de público e a iluminação sombria transmitem uma sensação de melancolia. A cena capturada parece ser um momento de introspecção, em que o grande artista confronta sua própria mortalidade, mostrando a dualidade entre o brilho do palco e a fragilidade da vida.