Há poucos dados biográficos
seguros sobre Eurípedes; sua figura transmitida na Antiguidade constituía,
sobretudo, a partir de sua representação em Aristófanes, sem se levar em conta
o jogo próprio da comédia, como se veria quando da discussão de As Tesmoforiantes. A partir do
Romantismo, foi construída uma tese de uma progressiva racionalização que foi
de Ésquilo a Eurípedes, e que teve seu auge com Nietzsche: a decadência do
gênero trágico. (Ler também: O nascimento da tragédia - Nietzsche).
Entre 455 e 405, as peças de
Eurípedes entraram em competição vinte e duas vezes. Saíram-se vencedoras por
quatro vezes (Sófocles ganhou dezoito). Medeia
é de 431 e pertence a uma tetralogia que ficou em terceiro lugar. Embora tenha
recebido o primeiro prêmio poucas vezes ao longo de sua vida, não há dúvida de
que Eurípedes foi um tragediógrafo de grande importância.
Eurípedes passou seus
últimos anos na Macedônia na corte do Rei Arcesilau junto com vários artistas
atenienses, o que indica não só o prestígio do próprio Eurípides mas também do
gênero literário a que este esteve vinculado, cuja popularidade fora de Atenas
só aumentou no século IV. Enquanto Ésquilo saía de moda e Sófocles mantinha seu
prestígio, Eurípides passou a ser o mais festejado dentre eles. Daí a grande influência
de Eurípedes sobre a Comédia Nova, no que diz respeito aos enredos e sabor retórico
das falas das personagens.
Medeia: a história
A história da expedição dos
Argonautas é no mínimo tão antiga quanto à tradição oral que deu origem à Ilíada e Odisseia. Na tradição oral dos mitos heroicos, as histórias
contadas não tinham uma única forma fixa, mas multiformes, ou seja, possuíam
uma estrutura que podia ser preenchida por diversas formas narrativas, sendo
que a variação era ocasionada por diferentes fatores, sendo o uso pouco
difundido da escrita, pelo menos até meados do século V, apenas um deles. As
variações, porém, tinham um certo limite: não era possível uma versão da guerra
de Tróia ou da viagem de retorno de Odisseu na qual Tróia não fosse conquistada
pelos gregos ou o herói da Odisseia
perecesse antes de chegar a Ítaca. Quanto ao público, os espectadores esperam
que a história que vão ver e ouvir terá diferenças mais ou menos substanciais em
relação as outras formas da mesma, via de regra, amplamente difundidas desde sua
infância pelas mulheres da cidade - mãe, ama - e também por uma série de
práticas sociais cotidianas que podiam representá-las pictoricamente não só nos
frisos dos templos mas em uma profusão de objetos de cerâmica usados para os
mais diversos fins.
Quanto à história de Jasão e
Medeia, ela pode ser resumida da seguinte forma: Jasão, quando criança, foi educado
pelo centauro Quíron, enquanto seu tio Pélias era rei de Iolco (nota-se que no
período arcaico praticamente não existia mais monarquias na Grécia). Jasão chega
à cidade para reclamar sua herança e é enviado até Cólquida (hoje Geórgia, no
extremo leste do Mar Negro), terra governada por Aetes, para realizar uma
missão impossível: roubar o Velo de Ouro. Jasão constrói um navio chamado Argo
e reúne diversos dos melhores heróis de sua geração, entre eles, Peleu,
Télamon, Orfeu e Héracles (este viria a abandonar a expedição antes de seu
término). Para realizar suas façanhas, recebe ajuda dos deuses e da filha de
Aetes, Medeia, que se apaixona por ele. Para convencer a moça, Jasão suplica,
persuade e a seduz para obter ajuda, prometendo levá-la embora com ele e depois
se casarem. Sem ajuda de Medeia, Jasão não teria conseguido realizar as provas
de Aetes: subjugar o touro que cospe fogo, plantar sementes de dragão e
derrotar os combatentes nascidos da terra. Medeia ajuda Jasão a conseguir o
Velo de Ouro, guardado por uma serpente. Também mata o próprio irmão Apsirto.
Em Hesíodo, Medeia é imortal e divina; mas mortal, em Eurípedes.
Ao chegar em Iolco, é com a
ajuda de Medeia que o rei Pélias é assassinado; rei esse que depusera do trono
o pai de Jasão, Aeson. Na ocasião, Medeia havia falsamente prometido ao rei
Pélias torná-lo jovem para que este deixasse um descendente masculino. Morto o
rei, o casal muda-se para Corinto, onde ambos são estrangeiros. Jasão, porém,
logo abandona Medeia para se casar com a filha do rei de Corinto.
Sobre a trágica morte dos
filhos de Medeia e Jasão, conhecemos estas versões:
a) Os coríntios matam os
catorze filhos do casal, pois não queriam ser governados por uma feiticeira
estrangeira (Jasão havia se tornado rei); como purgação, a cada ano, catorze
jovens passavam uma temporada no templo de Hera Akraia;
b) Medeia mata Creonte e se
refugia em Atenas, mas deixa os filhos, muito pequenos, em Corinto no templo de
Hera. Eles são mortos pelos coríntios que, por sua vez, acusam-na de matá-los;
c) Os filhos morrem através
de uma tentativa de torná-los imortais.
Quanto a Teseu, é uma
espécie de herói nacional ateniense pelo menos desde o século IV. Seu pai Egeu
casa-se com Medeia. O filho volta, incógnito, posteriormente. Medeia o reconhece
antes do pai, tem medo, e tenta se livrar dele por duas vezes. Antes da segunda
tentativa, o pai o reconhece e bane Medeia.
Fontes:
EASTERLING, P. E. (org.) The
Cambridge companion to Greek tragedy. Cambridge: Cambridge University Press,
1997.
GOLDHILL, S. Amor, sexo
& tragédia. Zahar: Rio de Janeiro, 2007.
MASTRONARDE, D. J. Euripedes:
Medeia. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.
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o mito em cena. Ateliê Editorial: São Paulo, 2003.
MOSSMAN, J. Euripedes: Medeia.
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ROISMAN, H. M. (org.) The
encyclopedia of Greek tragedy. Chichester: Wiley-Blackwell, 2014.
ROMILLY, J. A tragédia
grega. Edições 70: Coimbra, 1999.
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