sábado, 6 de setembro de 2025

Arthur Brooke e a História Trágica de Romeus e Julieta: A Versão Moralista que Inspirou Shakespeare

A ilustração é um intrincado design no estilo de gravura antiga, com uma borda ornamentada que inclui elementos florais e grotescos. Ela é dividida em duas seções circulares principais, cada uma representando um aspecto da "História Trágica de Romeus e Julieta" de Arthur Brooke, com um forte subtexto moralista.  No círculo superior, vemos quatro figuras em trajes do século XVI, provavelmente Romeu, Julieta, e possivelmente o Frade Lourenço e um outro personagem, envolvidos em uma conversa discreta. As figuras são desenhadas com seriedade, e acima delas, um olho que tudo vê dentro de um triângulo (um símbolo comum de providência ou julgamento divino) irradia luz, sugerindo que suas ações estão sob observação celestial e moral. O título "THE TRAGICALL HISTORY OF" (A História Trágica de) está elegantemente inserido acima deste círculo.  O círculo inferior é sombrio e representa o desfecho trágico e as consequências. No centro, uma figura esquelética alada (personificando a Morte) está curvada sobre uma jovem adormecida ou falecida em um leito, segurando uma ampulheta, simbolizando o tempo que se esgotou e o destino final. Este círculo é emoldurado por uma faixa que diz "A MORAL WARNING" (Um Aviso Moral), reforçando o propósito didático do poema de Brooke.  Em ambos os lados da ilustração, fora dos círculos centrais, há figuras encapuzadas e sombrias, sentadas em pedestais. À esquerda, a figura está sob uma faixa que diz "DISOBEDIENCE" (Desobediência), enquanto à direita, a figura está sob "PUNISHMENT" (Punição). Esses elementos emolduram a cena central, conectando diretamente a desobediência dos amantes com a punição inevitável, um tema central na obra de Brooke. O estilo geral é de uma gravura detalhada, com sombreamento cruzado e um tom sépia que evoca a antiguidade e a seriedade da época.

Romeu e Julieta é uma história de amor universalmente conhecida, mas poucos sabem sobre a fonte principal que inspirou a obra-prima de William Shakespeare. Publicada em 1562, A História Trágica de Romeus e Julieta, um poema narrativo de Arthur Brooke, foi a versão em língua inglesa mais direta e influente que serviu de base para a peça de teatro. Longe de ser apenas uma tradução, o trabalho de Brooke é uma adaptação moralista que moldou a percepção da história por uma audiência elisabetana.

Da Tradição Italiana à Literatura Inglesa: A Jornada de Romeu e Julieta

A história dos amantes de Verona não foi inventada por Shakespeare. Ela evoluiu ao longo de séculos, passando por diversas adaptações na Itália e na França. A versão mais notável foi a de Matteo Bandello, publicada em 1554, que já incluía a maioria dos elementos que conhecemos: o ódio entre as famílias, o amor à primeira vista, o frade que ajuda o casal, o casamento secreto e a trágica morte no túmulo.

A versão de Bandello foi traduzida para o francês por Pierre Boaistuau em 1559, em uma obra chamada Histoires tragiques. Foi a partir desta tradução que Arthur Brooke criou a sua própria versão em inglês, em forma de um longo poema de quase 3.000 versos.

A Estrutura e o Tom de "Romeus e Julieta" de Arthur Brooke

O poema de Brooke se diferencia da peça de Shakespeare em tom e propósito. Enquanto a peça do Bardo de Avon celebra a paixão e o amor, o poema de Brooke tem um viés fortemente didático e moralista. O autor deixa isso claro desde o prefácio, onde condena a desobediência e a imprudência dos jovens amantes, apresentando a tragédia como uma punição divina por seus pecados.

O Romeu de Arthur Brooke: Imprudente e Impulsivo

Diferente do Romeu romântico e melancólico de Shakespeare, a versão de Brooke é mais imprudente. Ele se apaixona rapidamente por Julieta, mas o autor constantemente o repreende por sua paixão desenfreada. Seu amor não é visto como nobre, mas como uma luxúria juvenil que o leva a cometer atos irrefletidos, culminando em sua morte.

A Julieta de Arthur Brooke: Uma Jovem Dócil e Desobediente

Julieta é retratada como uma jovem de catorze anos, mas ela também é criticada por sua desobediência aos pais. A versão de Brooke não a coloca como uma heroína trágica, mas como uma cúmplice na desobediência. Seu amor por Romeu é visto com suspeita, e sua morte é apresentada como o resultado de suas escolhas.

O Frade Lourenço: Um Personagem Ambíguo

O Frade Lourenço de Brooke é mais ambíguo que o de Shakespeare. Apesar de ser o principal arquiteto do plano, o poema o culpa por sua imprudência e por sua "astúcia" ao tentar ajudar os amantes. A tragédia final é apresentada como a prova de que a intervenção do frade foi errada desde o início.

Por que a Versão de Brooke foi Tão Importante para Shakespeare?

Apesar de seu tom moralista, a obra de Arthur Brooke forneceu a Shakespeare a base sólida e a estrutura narrativa que ele precisava para sua peça. Shakespeare retirou do poema a maioria dos eventos, a ordem cronológica e os personagens principais.

  • Enredo Completo: O poema de Brooke já continha todos os eventos cruciais: a festa, o encontro no balcão (embora seja uma conversa por debaixo da janela), o casamento secreto, a morte de Mercúcio e Teobaldo, o banimento de Romeu, a poção do sono e a trágica morte no túmulo.

  • Personagens Definidos: Os nomes dos personagens, como Romeu, Julieta, Mercúcio, Teobaldo, a Ama e o Frade Lourenço, foram todos mantidos por Shakespeare.

  • Detalhes e Cenários: Brooke forneceu a Shakespeare detalhes importantes sobre o cenário, o tempo da narrativa e as ações dos personagens, que o dramaturgo habilmente transformou em diálogos e cenas memoráveis.

No entanto, Shakespeare fez duas mudanças cruciais. Primeiro, ele condensou a linha do tempo, que em Brooke se passa ao longo de nove meses, para apenas quatro dias. Isso intensificou o sentimento de urgência e a paixão avassaladora dos jovens. Segundo, e mais importante, Shakespeare mudou o tom. Ele transformou a história moralista de advertência em um drama sobre o destino, a fatalidade e a força do amor que desafia as convenções sociais.

A Influência e o Legado de Arthur Brooke

Embora o poema de Arthur Brooke seja ofuscado pela genialidade da peça de Shakespeare, sua importância na história da literatura é inegável. Ele serviu como a ponte entre as versões italianas e a obra que se tornaria uma das peças mais famosas de todos os tempos. A moralidade do poema reflete a visão de mundo da sociedade elisabetana e oferece uma perspectiva única sobre como a história de Romeu e Julieta foi percebida antes de ser transformada em uma tragédia de amor épica.

(*) Notas sobre a ilustração:

A ilustração é um intrincado design no estilo de gravura antiga, com uma borda ornamentada que inclui elementos florais e grotescos. Ela é dividida em duas seções circulares principais, cada uma representando um aspecto da "História Trágica de Romeus e Julieta" de Arthur Brooke, com um forte subtexto moralista.

No círculo superior, vemos quatro figuras em trajes do século XVI, provavelmente Romeu, Julieta, e possivelmente o Frade Lourenço e um outro personagem, envolvidos em uma conversa discreta. As figuras são desenhadas com seriedade, e acima delas, um olho que tudo vê dentro de um triângulo (um símbolo comum de providência ou julgamento divino) irradia luz, sugerindo que suas ações estão sob observação celestial e moral. O título "THE TRAGICALL HISTORY OF" (A História Trágica de) está elegantemente inserido acima deste círculo.

O círculo inferior é sombrio e representa o desfecho trágico e as consequências. No centro, uma figura esquelética alada (personificando a Morte) está curvada sobre uma jovem adormecida ou falecida em um leito, segurando uma ampulheta, simbolizando o tempo que se esgotou e o destino final. Este círculo é emoldurado por uma faixa que diz "A MORAL WARNING" (Um Aviso Moral), reforçando o propósito didático do poema de Brooke.

Em ambos os lados da ilustração, fora dos círculos centrais, há figuras encapuzadas e sombrias, sentadas em pedestais. À esquerda, a figura está sob uma faixa que diz "DISOBEDIENCE" (Desobediência), enquanto à direita, a figura está sob "PUNISHMENT" (Punição). Esses elementos emolduram a cena central, conectando diretamente a desobediência dos amantes com a punição inevitável, um tema central na obra de Brooke. O estilo geral é de uma gravura detalhada, com sombreamento cruzado e um tom sépia que evoca a antiguidade e a seriedade da época.

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