terça-feira, 1 de outubro de 2019

O Capote de Gogol, por Eikhenbau - resumo

RESUMO: COMO É FEITO O CAPOTE DE GOGOL – B. Eikhenbaum

Como é feito o capote de Gogol, de Boris Eikhenbaum, é um texto bastante complexo e, até certo ponto, difícil. Eikhenbaum parece propor uma leitura da obra de Gogol divergente da crítica tradicional. Para isso, o autor salienta aspectos formais da narrativa e apresenta soluções diferentes como chave de leitura para a obra de Gogol. Esta chave é a narrativa direta, e é através dela que Eikhenbaum extrai todos os elementos caracterizadores dessa literatura. Neste intuito, o autor empreende uma análise pormenorizada do conto O Capote, na qual nada escapa, para demonstrar sua tese. Todavia, o estilo de escrita de Eikhenbaum é bastante sinuoso (segundo alguns, devido à tradução em língua portuguesa), o que exige bastante concentração do leitor. É, no entanto, bastante satisfatória a sua crítica e parece contemplar uma compreensão adequada da obra do grande escritor russo.

Pintura de uma catedral russa

O autor inicia o texto dissertando sobre a principal característica da narrativa direta, isto é, o papel de que nela desempenha o narrador, sobressaindo-se sobre estrutura da trama. Neste sentido, as novelas de Gogol fornecem farto material; pois o enredo, pobre ou inexistente, é apenas um catalizador para que o narrador se destacar através do uso de um tom de caráter mímico e declamatório, permeados por anedotas, efeito cômico e trocadilhos. Assim sendo, um aspecto interessante na obra do escritor russo é o fato de que Gogol foi um grande leitor de sua própria obra, ressaltando-se dois estilos de leitura: a declamação patética e melodiosa e a imitação mímica. Esta capacidade de leitura de sua própria obra caracteriza sua narrativa direta a partir da oralidade e das emoções inerentes ao discurso e, portanto, enfatizam mais a gesticulação do que o encadeamento lógico racional do enredo. Neste particular, os nomes dos personagens são cuidadosamente escolhidos, sempre procurando o efeito cômico, por meio de trocadilhos, e que eleva o tom da narrativa ao primeiro plano, relegando a trama para uma importância secundária.

Com relação à confecção do conto O Capote, a narrativa também segue este esquema geral. O aspecto formal da narrativa desvia-se do enredo comezinho e extrai ao máximo toda a sua potência. No início do conto, Gogol abusa dos trocadilhos de um modo quase nonsense, chegando mesmo às raias do absurdo. Para definir com precisão a narrativa de Gogol, Eikhenbaum formula a concepção de transracionalidade obtida por uma semântica fônica muito particular. Segundo o autor, essa é uma característica marcante de Gogol, isto é, princípios articulatórios e mímicos, que n’O Capote é precisamente declamatório e patético. De acordo com este aspecto formal, não é estranho à construção de períodos muito longos que terminam de forma surpreendentemente simples ou mesmo algumas palavras insólitas que parecem contradizer todo o desenvolvimento do período semântico. Outra característica do conto em questão, é o fato dos personagens apresentarem poucas falas e suas frases aparecerem descontextualizadas, configurando, assim, como definiu o autor, uma “linguagem de marionete”. O conto O Capote se inicia por um brusco mudar de tom, alterando constantemente a entonação épica por um tom sarcástico. As anedotas permeiam a trama e sempre se destaca o efeito auditivo da narrativa, dando a impressão de um jogo.

Esta alternância de entonação é utilizado como um procedimento típico do grotesco. É neste sentido que o banal e o irrisório da vida cotidiana, por meio da narrativa direta, alcançam proporções gigantescas. Assim, a aquisição de um capote por um “mero funcionário público” torna-se um acontecimento de magnitude incomensurável e digno de nota, do mesmo modo que uma epopeia. Resumidamente: “Esta hiperbolização grotesca se desenvolve como anteriormente sobre o fundo de uma narração cômica, entrecortada de trocadilhos, de palavras e expressões engraçadas, de anedotas, etc.” (Eikhenbaum). O final é, segundo as palavras do autor, uma apoteose do grotesco, porém, nem totalmente fantástico nem romântico, mas um jogo fantástico com a realidade, um grotesco reverso.

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