quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Si hay gobierno, soy contra - Fecaloma - punk rock

 Si hay gobierno, soy contra

No mês passado, o grupo de punk rock Fecaloma, uma banda parceira e conhecida aqui no blog, lançou seu mais recente álbum – um “EP”, como se dizia antigamente –, intitulado A vocês, que inclui duas composições: “Si hay gobierno, soy contra” e “Fins de semana de solidão”.

O título do álbum é bastante inusitado em um ambiente marcado pelo narcisismo, como o das bandas de rock em geral. A vocês é dedicado ao público, aos fãs da banda Fecaloma. (Se é que neste caso o termo “fã” é correto e não provocaria a censura da banda por essa impropriedade de nossa parte). Ou seja, o título é um tributo ou uma homenagem a quem o grupo de punk rock reconhece um lugar de mais alta estima e declara manter um compromisso inabalável de igualdade. (Numa outra ocasião, a banda entoou o seguinte verso: “É o público que manda, é o público que manda”).

A primeira canção de A vocês, “Si hay gobierno, soy contra”, é um punk rock bem empolgante que bem poderia ser um hino anarcopunk, repercutindo ecos da Marselhesa ou da Internacional em sua letra, não fosse a recusa da banda em adotar símbolos que fragmentam e dividem a humanidade tais quais as insígnias dos Estados e nações. (Numa de suas músicas mais conhecidas, “Sertapunk”, o verso “O hino que canto é uma música qualquer” não deixa margem para dúvida sobre os lemas iconoclastas da banda Fecaloma). A segunda composição do EP, “Fins de semana de solidão”, é um misto de um tipo de reggae (ou algo assim) e o punk propriamente dito. A letra poderia ser interpretada como uma versão punk pós-moderna de A uma passante, do poeta Baudelaire.

Minha bandeira é minha roupa

No entanto, um tom melancólico envolve o lançamento, pois na descrição do vídeo no YouTube há uma menção da terrível desilusão por que sofre D. Quixote quando descobre que todas as aventuras de cavaleiro andante por ele vivida não eram senão meras fantasias de uma mente perturbada. A banda parece querer traçar um paralelo entre sua trajetória, de velhos adolescentes idealistas que desejaram um dia a revolução social através da música de protesto, com o clássico romance de Miguel de Cervantes Saavedra. Algo como, em tempos sem grandes ideais, como os da atualidade, comparar um revolucionário (anarquista, socialista, comunista) ao solitário cavaleiro da triste figura. Lutar por uma utopia, no século XXI, é lutar contra moinhos de vento. No contexto do movimento punk, se nos anos 80 e 90 formar uma banda punk era só “um pretexto para mudar o mundo”; hoje, mudar o mundo é só um pretexto para ter uma banda. A revolução está fora de moda!

D. Quixote - Picasso

Cabe ressaltar que esse engajamento não é meramente performático ou supérfluo, além dos três álbuns da banda, Transgredir por transgredir (1998), Rebelião adolescente (2001) e Ocupar e resistir (2005), o grupo Fecaloma assina três traduções sobre a rebelião dos marinheiros anarquistas de Kronstadt, no início do século XX. O que torna essa banda única.

Kronstadt, 1921


Kronstadt, 1921
(Disponível: site Crítica Desapiedada)
A verdade sobre Kronstadt

(Disponível: Amazon)

A Comuna de Kronstadt: o crepúsculo dos sovietes

A comuna de Kronstadt - Ida Mett
(Disponível: Amazon)

Pois bem, em que pesem as desilusões a que todos nós estamos fadados a experimentar cedo ou tarde, o álbum A vocês do Fecaloma certamente não vai decepcionar os “fãs” da banda (com o perdão da palavra), que poderão apreciar as letras bem escritas e originais que marcam esta singular banda de punk rock brasileira.

Fedaloma, A vocês

Si hay gobierno, soy contra

Jean: vocal e guitarra; Erick: baixo e backing vocal; e Arthur: bateria e backing vocal

Letras

Lado A

Si hay gobierno, soy contra

Salve a todxs Anarquistas

Contra nós o estandarte

Dos batalhões governistas

Se ergueu com jugo covarde

 

Soldados da tirania

Servos da autoridade

Em nome da democracia

Marcham sobre a liberdade

 

Si hay gobierno, yo soy contra

O capital perecerá

Anarquia Vingará

Si hay gobierno, yo soy contra

O Estado cairá

Anarquia vencerá

 

Salve a todxs Anarquistas

Bem unidos, camaradas

Contra falanges fascistas

Levantemos barricadas

 

Somos nós a resistência

Desbravando a tempestade

Com ternura e independência

Libertar a humanidade

 

Lado B

Fins de semana de solidão

Fins de semana de solidão

Por acaso eu te encontro

 

Longe de mim

Às vezes me olha

Fica na sua

E me provoca

 

Mas nas horas que se vão

Não há tempo pros nossos sonhos

 

Eu chego junto

E você foge

Desentendida

Me mata de vontade

 

Refrão:      Porque só temos esta noite

Amanhã te perderei nas multidões

 

Fins de semana de solidão

Por acaso eu te encontro

 

Me desespero

Você disfarça

Eu imploro

Você acha graça

 

E nas horas que se vão

Não há tempo pros nossos sonhos

 

Mais um pouco

Não sei se te vejo

Me dê uma chance

Ou te roubo um beijo


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