por Edu B.
Antes
de entrarmos na discussão propriamente dita, que envolve os dois artigos,
convém-nos reportarmos a um brevíssimo preâmbulo, a título de ilustração, dos
aspectos mais gerais das ideias que notabilizaram a psicologia de Maslow.
A teoria da motivação humana ou da hierarquia das necessidades se tornou
muito conhecida com a clássica figura da pirâmide disposta em cinco níveis
coloridos. Partindo-se do pressuposto de que as necessidades humanas tendem a
ser satisfeitas por um comportamento motivado, a base da pirâmide representa as
necessidades consideradas mais vitais para a sobrevivência de um ser humano,
como a alimentação, o sono, a respiração etc., as quais quando satisfeitas
ensejam um escalar para o nível mais alto, de maior complexidade, como a
necessidade de abrigo, proteção etc., e assim por diante, até chegar ao topo.
Deste modo, a pirâmide estabelece cinco níveis hierárquicos de necessidades, a
saber, fisiológicas; segurança; afiliação ou de pertença e
amor; estima; e, por fim, autorrealização ou autoatualização.
Com
base nesse esquema geral, esboçado acima, podemos aprofundar mais os conceitos
da teoria, tomando por referência os dois artigos que inspiram o debate de
nossa resenha crítica. A princípio, enfoquemos nos aspectos conceituais que os
unem, pois seria interessante, a fim de esclarecimento, nos atentarmos aos elos
comuns de ambas as proposições, ou seja, os conceitos de motivação e hierarquia das
necessidades básicas, para então, munidos deste arcabouço teórico, pontuarmos
as diferenças.
Motivação
O
primeiro conceito importante na teoria de Maslow que devemos ter em vista é o
de motivação, que pode ser definido
como um conjunto de fatores que impulsionam o comportamento de um indivíduo
para atingir um determinado fim. Sampaio (2009) argumenta que, para Maslow, “o
indivíduo é um todo integrado e organizado” e que, por isso, pode desejar
inúmeros objetos, a fim de obter alguma gratificação, já que as necessidades
inserem-se não apenas no nível do organismo biológico como também na esfera
cultural e social. Para corroborar tal concepção, conforme salientam os
autores, Cavalcanti, Gouveia, Medeiros, Mariano, Moura e Moizéis (2019), a
motivação emerge de necessidades não resolvidas e tem como mola propulsora duas
forças: a privação, compreendida como uma “falta” que
estimula o indivíduo a supri-la por diferentes meios e a gratificação de uma necessidade, que recompensa e estimula a
emergência de um novo tipo de necessidade, geralmente mais sofisticada. Assim
sendo, a motivação suscita uma série de necessidades
básicas que podem ser hierarquizadas, de acordo com seu nível de
complexidade, e classificadas gradativamente por inferiores e superiores.
Hierarquia das necessidades
Maslow
(1954) postula que, a despeito da singularidade de cada ser humano, toda pessoa
possui necessidades comuns e gerais que precisam ser satisfeitas. Portanto, a
necessidade pode ser entendida como um certo desequilíbrio de uma dada situação
envolvendo privação e, daí, motivar a supressão do estado de carência por meio
de sua resolução. A privação de uma necessidade ativa um processo de
compensação, por meio da gratificação, num escalar crescente que pressupõe
diferentes níveis de necessidades básicas.
A
partir dessa dinâmica, Maslow classificou as necessidades a partir de sua
finalidade e desenvolveu um modelo em que as necessidades mais elementares,
relacionadas à sobrevivência, dão subsídios, quando recompensadas, à geração de
novas necessidades mais complexas, abstratas e de caráter espiritual. O modelo
é composto, como já assinalado, por cinco níveis diferentes de necessidades,
que são classificadas e hierarquizadas.
Deste
modo, a teoria hierárquica das necessidades é frequentemente representada em
forma de uma pirâmide dividida em cinco níveis distintos e gradativos, representando
as necessidades inferiores na base e as necessidades superiores no topo, o que
significa dizer que um indivíduo só pode alcançar de forma progressiva a sua
plena realização satisfazendo todos os níveis hierárquicos. Feitas estas
considerações, as necessidades são classificadas do seguinte modo:
Necessidades fisiológicas
São
as de tipo biológico, compreendendo os
impulsos, além da dinâmica de homeostase e de apetite (SAMPAIO, 2009). São
as necessidades primordiais, porque são a base da autopreservação de um
organismo e sua privação total poderia colocar em risco a sua sobrevivência
física. Portanto, a respiração, a fome, a sede, o sono, a temperatura corporal
são elencadas nessa categoria formando a base indispensável do modelo de Maslow.
Um dado interessante neste quesito, apontado pelos autores Cavalcanti, Gouveia,
Medeiros, Mariano, Moura e Moizéis (2019), é que, segundo pesquisas, pessoas
que vivem em países pobres apresentam uma pontuação elevada em suas
necessidades básicas, evidenciando uma relação estreita entre este nível e o
desenvolvimento de uma sociedade. Veremos, mais abaixo, ao analisarmos o artigo
de Sampaio, que a não satisfação de uma necessidade básica terá implicações decisivas
no desenvolvimento ético e espiritual.
Necessidade de segurança
Se as
necessidades fisiológicas forem relativamente satisfeitas, o indivíduo estará
em condições de galgar a próxima etapa, a necessidade de segurança. De acordo
com Sampaio, esse tipo de necessidade surge da “inexistência de ameaças
percebidas no ambiente”. Ou seja, a necessidade de proteção como forma de
garantir a sobrevivência diante dos perigos iminentes em um contexto ameaçador e
de instabilidade. Evidentemente, a necessidade de abrigo aparece como a mais
banal. No entanto, tal necessidade não se restringe apenas à moradia, mas
também a estabilidade financeira, os cuidados com a saúde, o corpo, entre outros.
Necessidade de afiliação ou de pertença e
amor
É a categoria
imediatamente acima da necessidade de segurança e que abrange a troca de
afetos, as relações pessoais, o amor, a amizade, proporcionando um sentimento
de pertencimento e afiliação. Sampaio adverte, entretanto, que, embora a
sexualidade envolva intimidade, esta não pode ser classificada nessa classe,
pois o comportamento sexual se enquadra nas necessidades primordiais, de tipo
fisiológico.
Necessidade de estima
É a
quarta necessidade básica na hierarquia e pode ser definida através da imagem
que uma pessoa possui de si mesma e de seu desejo de reconhecimento e receber
estima de outras pessoas (SAMPAIO, 2009). Esta necessidade pode ser dividida
então em dois subgrupos: o primeiro deles diz respeito à necessidade em que as
pessoas individualmente têm de se sentir confiantes, por meio de realizações
profissionais, do mérito por seus feitos, pela sua competência etc.; o segundo
refere-se ao reconhecimento positivo advindo de terceiros, principalmente no
que concerne à consideração, à reputação, ao prestígio, à dominância, ao
status, entre outros. Quando relativamente satisfeita, a necessidade de estima promove
uma valorização da autoimagem de um indivíduo; se frustrada, um sentimento de
inferioridade e de desvalorização tende a prevalecer.
Necessidade de autorrealização ou
autoatualização
Maslow
estipula o nível mais elevado na hierarquia das necessidades, a autoatualização
ou autoatualização, compreendida enquanto vocação ou aspiração para algo, potencializando
talentos latentes e suas realizações. Segundo Sampaio, Maslow se alinha a
pesquisadores, como Jung, que defendiam que “as pessoas têm um potencial
interno que necessita tornar-se ato”. Cavalcanti, Gouveia, Medeiros, Mariano,
Moura e Moizéis (2019) listam como características de pessoas autorrealizadas “a
espontaneidade, a criatividade, a autonomia e a resistência à doutrinação”,
entre outras.
Referências bibliográficas
Cavalcanti,
T. M., Gouveia, V. V., Medeiros, E. D., Mariano, T. E., Moura, H. M., Moizéis,
H. B. C. (2019). Hierarquia das
necessidades de Maslow: Validação de um Instrumento. Psicologia: Ciência e
Profissão, 39, 1-13.
Sampaio,
J. R. O Maslow desconhecido: uma revisão
de seus principais trabalhos sobre motivação, R.Adm., São Paulo, v.44, n.1, p.5-16,
jan./fev./mar. 2009.
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