Neste mês de dezembro atingimos a marca de 100.000 visitas!!!
Os editores do blog Verso, Prosa & Rock’n’Roll
agradecem a tod@s @s noss@s leitorxs pela inestimável colaboração.
Onde literatura rola rock - som notas letras poesia música arte melodia palavras cultura ritmo livros
Neste mês de dezembro atingimos a marca de 100.000 visitas!!!
Os editores do blog Verso, Prosa & Rock’n’Roll
agradecem a tod@s @s noss@s leitorxs pela inestimável colaboração.
Benvenuto Cellini nasceu em Florença no ano de 1500, filho de Giovanni Cellini, fabricante de instrumentos musicais, de quem herdou a habilidade manual, e Maria Lisabetta Granacci. O patriarca Giovanni queria seu filho músico e, por isso, os dedinhos ágeis do menino sobre as notas da flauta arrancavam lágrimas de alegria dos olhos paternos. A depender da vontade do pai, o futuro de Cellini já estava traçado trabalhando ao seu lado na oficina.
Realmente, Cellini era muito
talentoso e, quando adulto, chegou a ser músico do Papa. Mas, desde a infância,
Cellini gostava mesmo era do barulho dos martelos nas bigornas, do resfolegar dos
foles, das faíscas que os rebolos tiravam das gemas brutas, do flamejar das
brasas produzidas pela forja dos artesões nas ourivesarias.
Assim, para escapar das
admoestações de seu pai, o rapaz costumava fugir para cidades vizinhas e passar
meses fora de casa trabalhando como aprendiz de ourives. Aos 19 anos, partiu a
pé para Roma, onde se dizia que o Papa dava dinheiro aos artistas como as
fontes da cidade brotavam água.
Em Roma ganhou muito
dinheiro e dentro de pouco tempo montou sua própria oficina. Mas um tiro certeiro
de pistola daria início a uma sequência de aventuras que marcaram a conturbada
vida de Cellini.
Em 1527, Roma estava sitiada.
O Imperador Carlos V, da Áustria, ameaçava a cidade. Suas tropas eram
comandadas pelo Duque de Bourbon, o Condestável da França.
Cellini montava guarda como
sentinela voluntário quando viu os inimigos se aproximarem com uma escada de
mão para escalar as muralhas da cidade e invadi-la. Cellini então apontou o
arcabuz para o líder do grupo e bummm, atirou! A historiografia narra que
naquele dia o Condestável foi morto por um sentinela anônimo. Teria sido
Benvenuto Cellini? Se nos fiarmos nas palavras do próprio, sim!
Terminada a guerra, Cellini se
tornou gravador da Casa da Moeda do Vaticano. Quando seu irmão foi morto numa
briga de rua, o arrojado ourives não só jurou vingança como fez justiça com as
próprias mãos.
Em 1537, fui aprisionado por
ordem papal, conseguindo fugir pouco tempo depois sem muito sucesso, pois acabou
preso novamente. Nesse meio tempo, Francisco I, da França, manifestou o desejo
de nomear Cellini como ourives real. Um cardeal influente moveu os cordões
junto ao Papa e Cellini foi liberto e transportado para a corte mais luxuosa da
Europa. Foi nessa época que Cellini forjou o celebrado saleiro de ouro.
Em 1545, após algumas intrigas
palacianas, envolvendo uma amante do rei, Cellini foi obrigado a regressar para
Florença. Tornou-se então protegido do Duque Cosimo de Medici, notável patrono
das artes. Cosimo sugeriu a Cellini que fizesse uma estátua do herói mitológico
grego que matou a Medusa, o lendário Perseu. Empreendimento dos mais difíceis
já realizado por um artista em toda a história, Cellini cuidou detalhadamente
da tarefa monumental que o colocaria entre os maiores escultores de todos os
tempos. A estátua de Perseu foi colocada no centro de Florença, onde ainda hoje
se encontra.
Ao longo de sua vida, saíram
de suas laboriosas mãos exóticos anéis, camafeus, broches, facas e punhais
marchetados, jarros, cintos de prata para noivas, armas etc. Com sua arte,
sustentou não apenas seus pais como também uma irmã viúva e seus seis filhos, jovens
estudantes de arte e modelos e até uma família necessitada com a qual não tinha
parentesco algum.
No século XVII, a descoberta
de uma obra prima da literatura renascentista revelaria mais uma faceta do
artista genial: Autobiografia,
escrita por Cellini. O manuscrito ficou perdido por quase um século mas quando
foi publicado contagiou a Europa como uma febre alucinante. Goethe traduziu a
obra para o alemão, Berlioz compôs uma ópera chamada Benvenuto Cellini e Alexandre Dumas citou-a em Ascanius, além de se inspirar nas narrativas autobiográficas do
ourives aventureiro para criar o personagem D’Artagnan, de Os Três Mosqueteiros.
Cellini, um gênio completo.
Hank Ballard nasceu em Detroit, no dia 18 de novembro de 1927. Aos 7 anos, foi morar com alguns parentes muito religiosos no Alabama, onde começou a cantar música gospel na igreja. Na adolescência, porém, o blues passou a se tornar uma verdadeira obsessão musical na vida de Ballard. A música country também viria a influenciá-lo, especialmente o famoso artista Gene Autry.
Quando completou 15 anos, retornou novamente a Detroit. Enquanto trabalhava na linha de montagem de uma fábrica de automóvel, Ballard cantarolava algumas notas com seu timbre característico de tenor, impressionando muito um outro operário, Sonny Woods, que na época fazia back vocal num grupo de doo-wop chamado The Royals.
Em 1953, Ballard foi
convidado para substituir o vocalista dos Royals. No entanto, as composições de
Ballard acabaram por influenciar radicalmente a banda, que, por influência dele,
adotou um som mais agressivo, áspero e animado, deixando para trás as canções
melosas e sonhadoras que haviam sido até então a marca registrada do grupo.
A primeira gravação de
Ballard com The Royals foi “Get It”, de 1953, que alcançou o Top Ten nas
paradas de R&B. No ano seguinte, a banda mudou de nome, alterando-o para
Midnighters, com o intuito de evitar que fosse confundida com um outro grupo -
The Five Royales.
E neste mesmo ano, os Midnighters
lançam seu hit de maior sucesso, “Work with Me Annie”, de autoria de Ballard, que
atingiu o primeiro lugar nas paradas de R&B, apesar do boicote de muitas
estações de rádio, por causa da letra bastante obcena da cançao.
De fato, as canções escritas
por Ballard solidificariam a reputação da banda como a mais picante do R&B.
Ironicamente, seu maior sucesso
veio com o lançamento de uma de suas músicas – “The Twist” - gravada por outro
artista. A partir de 1963, Ballard saiu dos Midnighters e seguiu uma obscura
carreira solo.
Embora Hank Ballard seja
desconhecido do grande público, sua influência no desenvolvimento do rock’n’roll
é inegável e por isso entrou merecidamente no Rock and Roll Hall of Fame em
1990; os Midnighters, em 2012.
Há poucos dados biográficos seguros sobre Eurípedes; sua figura transmitida na Antiguidade constituía, sobretudo, a partir de sua representação em Aristófanes, sem se levar em conta o jogo próprio da comédia, como se veria quando da discussão de As Tesmoforiantes. A partir do Romantismo, foi construída uma tese de uma progressiva racionalização que foi de Ésquilo a Eurípedes, e que teve seu auge com Nietzsche: a decadência do gênero trágico. (Ler também: O nascimento da tragédia - Nietzsche).
Entre 455 e 405, as peças de
Eurípedes entraram em competição vinte e duas vezes. Saíram-se vencedoras por
quatro vezes (Sófocles ganhou dezoito). Medeia
é de 431 e pertence a uma tetralogia que ficou em terceiro lugar. Embora tenha
recebido o primeiro prêmio poucas vezes ao longo de sua vida, não há dúvida de
que Eurípedes foi um tragediógrafo de grande importância.
Eurípedes passou seus
últimos anos na Macedônia na corte do Rei Arcesilau junto com vários artistas
atenienses, o que indica não só o prestígio do próprio Eurípides mas também do
gênero literário a que este esteve vinculado, cuja popularidade fora de Atenas
só aumentou no século IV. Enquanto Ésquilo saía de moda e Sófocles mantinha seu
prestígio, Eurípides passou a ser o mais festejado dentre eles. Daí a grande influência
de Eurípedes sobre a Comédia Nova, no que diz respeito aos enredos e sabor retórico
das falas das personagens.
Medeia: a história
A história da expedição dos
Argonautas é no mínimo tão antiga quanto à tradição oral que deu origem à Ilíada e Odisseia. Na tradição oral dos mitos heroicos, as histórias
contadas não tinham uma única forma fixa, mas multiformes, ou seja, possuíam
uma estrutura que podia ser preenchida por diversas formas narrativas, sendo
que a variação era ocasionada por diferentes fatores, sendo o uso pouco
difundido da escrita, pelo menos até meados do século V, apenas um deles. As
variações, porém, tinham um certo limite: não era possível uma versão da guerra
de Tróia ou da viagem de retorno de Odisseu na qual Tróia não fosse conquistada
pelos gregos ou o herói da Odisseia
perecesse antes de chegar a Ítaca. Quanto ao público, os espectadores esperam
que a história que vão ver e ouvir terá diferenças mais ou menos substanciais em
relação as outras formas da mesma, via de regra, amplamente difundidas desde sua
infância pelas mulheres da cidade - mãe, ama - e também por uma série de
práticas sociais cotidianas que podiam representá-las pictoricamente não só nos
frisos dos templos mas em uma profusão de objetos de cerâmica usados para os
mais diversos fins.
Quanto à história de Jasão e
Medeia, ela pode ser resumida da seguinte forma: Jasão, quando criança, foi educado
pelo centauro Quíron, enquanto seu tio Pélias era rei de Iolco (nota-se que no
período arcaico praticamente não existia mais monarquias na Grécia). Jasão chega
à cidade para reclamar sua herança e é enviado até Cólquida (hoje Geórgia, no
extremo leste do Mar Negro), terra governada por Aetes, para realizar uma
missão impossível: roubar o Velo de Ouro. Jasão constrói um navio chamado Argo
e reúne diversos dos melhores heróis de sua geração, entre eles, Peleu,
Télamon, Orfeu e Héracles (este viria a abandonar a expedição antes de seu
término). Para realizar suas façanhas, recebe ajuda dos deuses e da filha de
Aetes, Medeia, que se apaixona por ele. Para convencer a moça, Jasão suplica,
persuade e a seduz para obter ajuda, prometendo levá-la embora com ele e depois
se casarem. Sem ajuda de Medeia, Jasão não teria conseguido realizar as provas
de Aetes: subjugar o touro que cospe fogo, plantar sementes de dragão e
derrotar os combatentes nascidos da terra. Medeia ajuda Jasão a conseguir o
Velo de Ouro, guardado por uma serpente. Também mata o próprio irmão Apsirto.
Em Hesíodo, Medeia é imortal e divina; mas mortal, em Eurípedes.
Ao chegar em Iolco, é com a
ajuda de Medeia que o rei Pélias é assassinado; rei esse que depusera do trono
o pai de Jasão, Aeson. Na ocasião, Medeia havia falsamente prometido ao rei
Pélias torná-lo jovem para que este deixasse um descendente masculino. Morto o
rei, o casal muda-se para Corinto, onde ambos são estrangeiros. Jasão, porém,
logo abandona Medeia para se casar com a filha do rei de Corinto.
Sobre a trágica morte dos
filhos de Medeia e Jasão, conhecemos estas versões:
a) Os coríntios matam os
catorze filhos do casal, pois não queriam ser governados por uma feiticeira
estrangeira (Jasão havia se tornado rei); como purgação, a cada ano, catorze
jovens passavam uma temporada no templo de Hera Akraia;
b) Medeia mata Creonte e se
refugia em Atenas, mas deixa os filhos, muito pequenos, em Corinto no templo de
Hera. Eles são mortos pelos coríntios que, por sua vez, acusam-na de matá-los;
c) Os filhos morrem através
de uma tentativa de torná-los imortais.
Quanto a Teseu, é uma
espécie de herói nacional ateniense pelo menos desde o século IV. Seu pai Egeu
casa-se com Medeia. O filho volta, incógnito, posteriormente. Medeia o reconhece
antes do pai, tem medo, e tenta se livrar dele por duas vezes. Antes da segunda
tentativa, o pai o reconhece e bane Medeia.
Fontes:
EASTERLING, P. E. (org.) The
Cambridge companion to Greek tragedy. Cambridge: Cambridge University Press,
1997.
GOLDHILL, S. Amor, sexo
& tragédia. Zahar: Rio de Janeiro, 2007.
MASTRONARDE, D. J. Euripedes:
Medeia. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.
MEDALHA, D. Tragédia grega:
o mito em cena. Ateliê Editorial: São Paulo, 2003.
MOSSMAN, J. Euripedes: Medeia.
Oxford: Aris&Philipps, 2011.
ROISMAN, H. M. (org.) The
encyclopedia of Greek tragedy. Chichester: Wiley-Blackwell, 2014.
Sensação adolescente nos EUA durante os anos 1950 e 1960, Ricky Nelson foi músico, cantor, compositor e ator. Pioneiro do country rock, influenciou artistas como Buffalo Springfield, Linda Ronstadt e The Eagles.
Nasceu Eric Hilliard Nelson,
de uma família de músicos, em Teaneck, New Jersey, no dia 8 de maio de 1940. Aos
8 anos de idade, iniciou sua carreira artística estreando o seriado humorístico
de rádio e televisão “The Adventures of Ozzie and Harriet”. No episódio “Ricky
the Drummer”, realizou uma performance como cantor ao dublar a música I'm
Walkin, do astro do rock Fats Domino.
Na adolescência, tocou
clarinete, bateria e também aprendeu os primeiros acordes de guitarra, tendo por
influencia Carl Perkins e demais artistas de rockabilly.
Para tentar impressionar uma
namorada, Ricky decidiu produzir um disco e, com a ajuda do pai, assinou
contrato com uma gravadora. Em março de 1957, grava I'm Walkin, A Teenager's
Romance e You're My One and Only Love.
Em 1957, lança seu primeiro
single Be-Bop Baby e, depois, seu primeiro álbum “Ricky”, que alcançaria o
primeiro lugar nas paradas de sucesso.
Entre 1958 e 1959, Ricky
superou Elvis Presley, emplacando doze sucessos – um a mais que o rei do rock!
Em 1959, sua fama o levaria
a estrear um papel no filme de faroeste “Rio Bravo”, ao lado de John Wayne e
Dean Martin.
Em 1987, entrou no Rock and
Roll Hall of Fame.
O festival era propriamente
internacional, atraindo milhares de habitantes para a cidade durante uma
semana, o que movimentava a economia da cidade. As despesas para um só dia das dionisíacas
poderia ser estimado, atualmente, em vultosos milhões de dólares ou equivalente a
3% das receitas públicas anuais da cidade. Isso não mudou radicalmente no
século IV, quando Atenas perdera seu império.
Quem financia é o khorêgos ("líder do coro"),
através de um tipo de imposto (litourgeia)
por meio da taxação sobre os mais ricos da cidade. Ele poderia oferecer sua
casa ou alugar um ginásio para os ensaios do coro: a elite gastava muito para a
sua própria honra.
Em agosto, o arconte epônimo
(mandato de um ano) escolhia três khorêgoi
para as tragédias, sendo o único critério sua riqueza (o 1 % da população); e também
cinco khorêgoi para as comédias. Aos
23 anos, Péricles foi khorêgos da
produção da tetralogia que inclui Persas
de Ésquilo. Os três dramaturgos que competiriam durante seis meses eram
atribuídos aos khorêgoi posto
sorteio, assim como os auletas, o que
indica seu prestígio e importância na performance.
Atores: no
início apenas um (o próprio dramaturgo). Lembremos que o mesmo ator, por conta
do uso de máscaras e figurinos, normalmente representava mais de um papel.
Ésquilo introduziu o uso do segundo ator e Sófocles, do terceiro. Os protagonistas
eram bem pagos.
Figurantes: os
atores e o coro provavelmente não recebiam um script.
Coro:
composto apenas por atenienses, geralmente homens jovens, que, durante o tempo dos
ensaios, eram dispensados das atividades militares.
A cidade forneceu, em certas
épocas, um "auxilio-teatro" (theorikôn)
para auxiliar aqueles com menos recursos com as despesas relacionadas aos
custos do ingresso. Alguns tinham assento livre por determinação de decreto.
Para nós, do mundo contemporâneo, a cobrança de ingresso parece normal, mas,
como se tratava de um evento religioso, o pagamento foi uma novidade no mundo
grego.
Aspectos da performance:
Orkhêstra,
"lugar da dança": espaço onde se representavam o coro e os atores.
Duas entradas longas, laterais (paradoi
- eisodoi) encontram-se nos lados
esquerdo e direito. Atrás, uma construção que compõe um cenário (skênê) com uma grande porta que também
podia ser usada para entrada e saída. No século V, é provável que a orquestra
tenha sido quadrangular.
Aquilo que sabemos da
tragédia grega vem, sobretudo, de dramas de tragediógrafos, dos quais temos
mais ou menos 10% do que foi provavelmente composto. Houve muitas dezenas de
outros em Atenas.
Semelhança entre
tragédias/dramas satíricos e comédias estavam no uso de fantasias e máscaras,
do coro, que dança, canta e é acompanhado por um auleta. Semelhanças são superficiais, na tragédia:
- cenário: geralmente um palácio
(às vezes, templo, cabana, caverna);
- figurino:
"rico";
- máscaras: mais naturais
(diferença principal, gênero e idade);
- coro: doze membros, depois
quinze (Sófocles);
- conteúdo: o passado
heróico, a idade dos heróis, uma época em que homens e deuses estavam mais
próximos e os homens eram mais poderosos que os do presente. Tempo passado e,
geralmente, lugares distantes.
Pode se defender que a
escala e o sucesso do investimento ateniense na tragédia teve um enorme impacto
na diversidade genérica da cultura poética grega, colaborando para o declínio
de muitas outras formas de gêneros.
Teatro, mito e democracia:
segundo Vernant, o teatro olha para o passado mítico com olhos de cidadão. As
instituições políticas não são exatamente as mesmas do público contemporâneo,
mas a homólogas. O mundo do drama não é totalmente estranho. Os próprios
espectadores podem fazer a conexão com o presente (alguns anacronismos;
etiologias religiosas).
Posts relacionados:
Tragédia: Medeia de Eurípedes (parte 3)
Ellas McDaniel ou, como viria a ser conhecido mundialmente, como um dos fundadores do rock'n'roll, “Bo Diddley”, nasceu em 30 de dezembro de 1928, numa pequena fazenda perto da cidade de McComb, Mississippi. Filho único de Ethel Wilson e Eugene Bates, foi, no entanto, adotado pela prima de sua mãe, Gussie McDaniel, com a qual passaria a conviver ao lado de seus irmãos de coração, Willis, Lucille e Freddie.
Em meados da década de 30, a
família se muda para Chicago, onde o menino começa a ter aulas de música na
Igreja Batista Missionária Ebenezer. Durante 12 anos estudou violino, chegando
mesmo a compor dois concertos para o instrumento. Em 1940, ganhou de Natal de
sua irmã Lucille o seu primeiro violão acústico. Foi nessa época que recebeu de
seus colegas de escola o apelido de “Bo Diddley”.
Pouco depois, o rapaz formaria
a sua primeira banda, o trio The Hipsters, que ficaria conhecido, por causa da
rua onde morava, com o nome de The Langley Avenue Jive Cats. Após a formatura
da escola, Bo Diddley trabalhou em diversos empregos de baixa remuneração,
exercendo a função de motorista de caminhão, de peão de obra e até de lutador
de boxe.
Em 1950, convida o
percussionista Jerome Green e o gaitista Billy Boy Arnold para fazerem parte da
banda. Depois de muitos anos de apresentações em bares de esquina e clubes da
periferia de Chicago, Bo Diddley finalmente tem a chance de gravar uma demo com
duas de suas canções: “Uncle John” e “I'm A Man”. Após receber muitas recusas
das gravadoras, nos anos de 1955 os irmãos Leonard e Phil Chess decidem dar uma
oportunidade ao compositor novato, sugerindo ao músico, porém, que este alterasse
o título da faixa “Uncle John” para o seu próprio apelido. Não deu outra, as
canções lançadas no compacto “Bo Diddley”/“I'm A Man” foram direto para o topo
das paradas de R&B.
Fascinado pelos ritmos que
ouvia com a banda da igreja nos tempos da infância, Bo Diddley aprimorou suas
técnicas musicais tentando reproduzir os sons da bateria nas cordas do seu
violão. Criou assim um estilo inovador e hipnótico, com um quê latino, através
do uso generoso de técnicas, como reverb, trémelo e distorção, que faziam sua guitarra
murmurar, gritar, rugir!
Com influências musicais tão
variadas como Louis Jordan, John Lee Hooker, Nat King Cole e Muddy Waters, Bo
Diddley forjou para sempre um estilo inconfundível que marcaria a música rock. Bandas
e personalidades do rock tão importantes como Elvis Presley, Rolling Stones, ZZ
Top, The Doors, The Clash, Buddy Holly, Prince, The Everly Brothers e Run DMC
reconheceram em Bo Diddley uma das figuras mais influentes do gênero. Não à
toa, suas músicas foram sucessos de muitos outros artistas, tais como “Not Fade
Away” (Rolling Stones), “Shame, Shame, Shame” (Shirley & Company), “Desire”
(U2) e “Faith” (George Michael), entre outras. Bo Diddley foi merecidamente um
dos primeiros homenageados no Hall da Fama do Rock'n'Roll.
Os três gêneros poéticos “naturais”, segundo os românticos, o épico, o lírico e o dramático, concernem ao período histórico das cidades-estado gregas (poleis, pl. de polis), nos períodos tardo-arcaico (século VI) e clássico, e são contextualizados, no imaginário grego, especificamente na consciência política ateniense, ao longo do século V, como elementos centrais da democracia em oposição à tirania, da civilização grega em geral como antítese do Império Persa, de Atenas como o avesso de Esparta. Os principais gêneros dramáticos gregos são a tragédia e comédia.
A tragédia foi uma invenção ateniense e está ligada à história política da cidade, em particular, o desenvolvimento de um regime democrático. A comédia provavelmente apareceu primeiro na Sicília e em Megara.
Para entender a criação da
tragédia como novo gênero, cabe ressaltar sua relação com os dois outros tipos
de performance espetáculos típicos do período arcaico e que se manifestaram em
Atenas no século V:
Performances épicas: os
heróis falam através do aedo, e menos
da metade é discurso indireto quando o aedo
mimetiza.
Poesia coral: canto, dança,
música, indumentária. Mais que a épica, um espetáculo para ser visto.
Para a melhor compreensão do
gênero trágico, recorreremos à definição de Aristóteles:
A
tragédia é a representação de uma ação, nobre e completa, com uma certa extensão,
em linguagem poetizada, cujos componentes poéticos se alternam nas partes da
peça, com o concurso de atores e não por narrativa, que pela piedade e pelo
terror opera a catarse desse gênero de emoções
(ARISTÓTELES, Poética).
Portanto, “se a tragédia tem
em comum com a epopeia O OBJETO – a ação nobre – e O MEIO – a linguagem
poetizada – elas se distinguem quanto AO MODO. Na epopeia, o poeta compõe a
representação narrando, de modo que ele próprio, na primeira ou terceira
pessoa, introduz as personagens. No teatro, o poeta faz as personagens agirem
diretamente, por isso, o que compõe se chama DRAMA (ação)” (MALHADAS, 2003, p.
25).
A tragédia surgiu no contexto
de uma festa pública chamada Grandes Dionisíacas ou Dionísias Urbanas, festival
em honra do deus Dionísio. Até 518, talvez só composta por desfile e sacrifícios.
A data então marca a construção do theatron
(estrutura de madeira temporária que acomodava os espetáculos), junto ao
Santuário de Dioniso, num dos lados da Acrópole de Atenas, e, ao mesmo tempo,
inaugura o início das competições de tragédia – dramas satíricos e coros
líricos de homens e meninos.
“O festival, que se passava
no final de fevereiro ou no começo de março, durava quatro dias. Cada dia
começava logo no amanhecer. A plateia era a maior reunião de cidadãos do
calendário. Na época em que os antigos assentos de madeira do teatro foram
substituídos pelos de pedra, entre 14 e 16 mil pessoas assistiam ao festival
regularmente. A maioria desses espectadores era de cidadãos: homens adultos com
direito a voto, chefes de família. Enquanto a assembleia, o mais importante
órgão político da democracia, tinha aproximadamente apenas seis mil pessoas em
audiência, e as cortes menos ainda, a escala da Grande Dionisíaca estava mais
próxima da dos jogos Olímpicos. A única ocasião na qual tantos cidadãos se
reuniam no mesmo lugar era em uma batalha importante. O festival era uma
verdadeira ocasião de Estado” (GOLDHILL, 2007, p. 202).
Atualmente, os vestígios do
teatro monumental de Licurgo de 330 podem ainda ser visitados.
Os festivais, como quase
tudo na mentalidade do grego antigo, caracterizavam-se pela já aludida
competição. Apesar disso, os dramas eram sempre parte de uma economia/cultura
da dádiva, sobretudo um dom, para Dioniso, oferecido por toda a cidade ou por
um indivíduo rico durante as festividades.
As Dionisíacas marcavam o início
das navegações no Mediterrâneo oriental depois de cinco meses de pausa e se
desenrolavam, na verdade, durante sete dias do mês de elaphebolion, nono do calendário Ático ou Ateniense (vigente nos séculos
V e IV a.C) e correspondente a mais ou menos o mês de março:
Dia 8 elaphebolion (~março): proagôn
(ante-competição). Os poetas montavam um palco no Odeão (Ôideion), junto com seu coro (tem a indumentária) e falavam sobre a
peça.
Dia 9 elaphebolion: eisagôgê
(introdução): ícone de madeira do deus levado do sul até a gruta no norte,
chamada academia, onde se cantavam hinos e se faziam sacrifícios. Retorno, com
tochas, ao teatro (com consumo de vinho?).
Dia 10 elaphebolion: feriado Pompê
(Desfile): principal procissão. Traz sacrifícios e entretenimento coral ao deus.
Estilo carnavalesco, espetáculo para
ser visto de dia. Multidão composta não apenas pelos coros (ao todo, vinte e
oito), que iriam se apresentar. Falos gigantes (vários metros) eram carregados
por coros (phallophoroi). Outros coros,
com indumentária exótica, amiúde travestidos, carregavam falos menores (ithyphalloi) e apresentavam cantos com
letras e movimentos obscenos. Outros se vestiam como pessoas exóticas, sátiros
ou animais estranhos. “O desfile tematizava a loucura criativa inspirada pela
presença de Dioniso e tinha como intenção provocar uma atmosfera de hilaridade
anárquica. Vinho fluía livremente para espectadores e participantes” (CSAPO
& WILSON, s. v. “Dramatic festivals”, 2014). Em estações ao longo do
percurso, os coros paravam para apresentar hinos (provavelmente a origem do
termo coral stasimon). O desfile
também levava 200 a 400 bois, atrás de um touro digno do deus, destinado ao
sacrifício no santuário de Dioniso em certa época. A maior parte dos bois vinha
das cidades que eram colônias ou aliadas, das quais se exigia que levassem em
falo e um boi para o desfile.
Neste mesmo dia, provavelmente,
a competição entre dez coros de meninos (cada um com cinquenta integrantes; um
por tribo) e, depois, de homens. Originalmente, cada canto relacionava-se ao
gênero hínico cúltico e processional chamado de ditirambo. Ao longo do século V, quando não era mais um gênero
marcadamente dionisíaco, tende a apresentar narrativas míticas variadas.
Dançavam em formação circular com acompanhamento do aulo.
Dia 11 elaphebolion: antes da Guerra do Peloponeso, possivelmente,
competição entre cinco comédias (cada uma de uma hora e meia a duas horas). O
número de comédias foi suprimido na guerra, e é possível que cada comédia fosse
apresentada uma por dia depois da tetralogia. A redução seria para se ganhar um
dia de trabalho, e não a poupança da apresentação de duas comédias.
Dias 12-14 elaphebolion: com exceção da época da
guerra, apresentação das tetralogias. No dia 12, cerimoniais cívicas diversas,
o que mostra que era o dia mais importante: desfile dos homens que ganharam prohedria (assento especial no teatro);
libações, seleção e juramento dos juízes; anúncio das honras públicas dadas
pela assembleia no espaço de um ano; desfile em apresentação das armas dadas
aos órgãos de guerra que alcançaram maioridade; apresentação do tributo trazido
pelas cidades do império. No último dia, anúncio da tetralogia e do ator
vencedor.
O processo de julgamento não é bem entendido: dez juízes, cada um colocando seu voto na urna. Talvez levasse em consideração o inclusivismo do público. Só cinco tábuas eram tiradas da urna. Caso não houvesse um vencedor inquestionável, mais duas e, depois, uma a uma. O resultado não é bom índice para popularidade dos dramaturgos. O foco era a performance do coro de cidadãos voluntários. O autor só participava da glória se ele mesmo tivesse coreografado o coro como didaskolos (mestre). Caso não o fizesse, poderia até ganhar popularidade, mas não reconhecimento oficial. Os poetas deviam receber um bom pagamento.
Posts relacionados:Carl Perkins (Carl Lee Perkins) nasceu no dia 9 de abril de 1932, em Tiptonville, Tennessee, e é considerado um dos principais e mais influentes artistas de rockabilly de todos os tempos, notabilizando-se por ser o autor do clássico “Blue Suede Shoes”.
Filho de um agricultor, aos
6 anos de idade, já trabalhava na roça. Oriundo de uma família pobre, para
ajudar no sustento da casa, o menino abandonou a escola quando ainda cursava a
oitava série. Depois das exaustivas horas na lida, à noite, Carl, seu pai e seu
irmão mais velho, James Buck, o Jay, descansavam ao som de música country e gospel.
Para cantar suas canções
prediletas, Carl aprendeu a tocar guitarra, com a qual ele imprimia nas músicas
de country uma levada de blues. Aos 14 anos, começou a compor e passou a
ensinar seu irmão Jay acordes de guitarra base para que este o acompanhasse em
seus ensaios musicais. Formaram então os Perkins Brothers e, algum tempo
depois, convidaram o irmão mais novo, Lloyd Clayton, para assumir o contrabaixo.
Como toda banda no início de
carreira, os irmãos enviavam fitas demos (demonstração) de suas composições
para diversas gravadoras, que, no entanto, nunca demonstraram interesse pelo
grupo. Então Carl foi para Memphis, onde conseguiu um teste e, enfim, assinou
contrato com a Sun Records, mesma gravadora de Elvis Presley e Jerry Lee Lewis.
Naqueles tempos, os Perkins
Brothers abriam os shows do rei do rock Elvis Presley em algumas de suas turnês.
Carl acabou fazendo amizade com Johnny Cash, que também pertencia ao casting da
Sun e que lhe sugeriu compor uma música sobre a nova mania adolescente: sapatos
azuis de camurça. De fato, numa apresentação da banda, Carl ouviu a discussão
de um casal na pista de dança: “Cuidado com meus sapatos de camurça”, alertou o
rapaz à namorada. Após o show, ao passar a noite em claro, Carl escreveria em
um saco de papel amassado a letra que se eternizou como uma das canções mais
emblemáticas da história do rock’n’roll. Em 19 de dezembro de 1955, lançava “Blue
Suede Shoes”.
Imediatamente, “Blue Suede
Shoes” alcançou o segundo lugar nas paradas da Billboard Hot 100, atrás apenas
de “Heartbreak Hotel”, de Elvis Presley. Meses depois, em março de 1956, o
próprio Elvis lançaria sua versão da canção. Em abril, “Blue Suede Shoes” havia
vendido um milhão de cópias!
Em 1958, desiludido com a
gravadora, por causa de direitos autorais, Carl assina com a Columbia Records. Em
1964, em turnê pela Inglaterra com Chuck Berry, recebe dos Beatles um convite
para uma sessão de gravação. Em 1968, junta-se a seu grande amigo Johnny Cash e
compõe “Daddy Sang Bass”, um grande sucesso. Em 1969, dá inicio a amizade com
Bob Dylan, com quem escreve “Champaign, Illinois”.
Sua vida foi marcada por
tragédias e alcoolismo. Ao mesmo tempo, conquistou a admiração de figuras do
rock não menos importante que Elvis Presley, Johnny Cash, George Harrison, Paul
McCartney, Bob Dylan, Eric Clapton, Paul Simon, John Fogerty, Tom Petty, Beatles,
Rolling Stones etc.
Em 1987, Carl Perkins entrou
no Rock’n’Roll Hall Of Fame.
Nikola Tesla nasceu em 1856, em Smiljan, uma aldeia da Croácia. Desde tenra idade, manifestou grande precocidade inventiva. Mas, na adolescência, sofreu com diversas doenças que fizeram com que seu pai, que desejava fazer dele padre, aceitasse a sugestão do filho de que a saúde dele próprio seria restabelecida por completo caso fosse enviado para estudar em um curso de engenharia em outra cidade.
Aos completar 19 anos, seu
pai então o matriculou em uma escola técnica em Graz, na Áustria. Certo dia, um
dos professores de Tesla fez demonstrações com um motor de corrente contínua. O
jovem aluno ficou fascinado. Porém, Tesla percebeu que as escovas soltavam
muita faísca e sugeriu que seria possível construir um motor sem escovas, a fim
de evitar o contato entre o rotor central e os polos fixos externos. Um motor assim,
afirmava o estudante, não soltaria faíscas, seria mais fácil de manejar e
funcionaria como uma corrente alternada.
Apesar de ser desestimulado
pelo professor, que o assegurou que tal ideia não era possível de se realizar
na prática, Tesla não desistiu de fabricar seu o motor ideal. Após ter cursado
durante um ano a Universidade de Praga, o rapaz, por força das circunstâncias, decidiu
interromper os estudos e obter um emprego na companhia telefônica de Budapeste:
seus pais estavam sobrecarregados financeiramente para mantê-lo frequentando as
aulas. Ainda assim, nunca abandonou o objetivo de construir o motor idealizado
por ele na escola técnica e nas horas de folga trabalhava intensamente para
solucionar os problemas relativos à exequibilidade do projeto.
Certo dia, quando passeava
no parque da cidade, Tesla teve um insight: vislumbrou mentalmente o motor de
seus sonhos em todos os detalhes. Pegou um galho de árvore e desenhou na areia
o motor, alterando sucessivamente os arranques e as paradas, diante de
transeuntes que olhavam surpreendidos. Havia conseguido descobrir um método
para fazer circular uma onda de corrente alternada pela bobina ao redor do
dispositivo, de tal maneira que o motor girasse pela ação rotativa constante do
campo indutor. Tesla acrescentou uma segunda onda de corrente alternada
assíncrona, e depois uma terceira. Era quase o mesmo que acrescentar mais
cilindros a um motor, originando o sistema de transmissão polifásico.
O jovem inventor construiu o
seu modelo ideal e não se surpreendeu quando viu que este de fato funcionava na
prática. Contudo, como não encontrou na Europa quem investisse na sua invenção,
resolveu ir para a América, com uma carta de recomendação para Thomas Edison,
escrita por um engenheiro norte-americano com quem havia travado amizade. No
ultimo instante, quando corria para o trem, que o levaria ao porto de embarque,
descobriu que tinham roubado sua carteira com as passagens e todo o dinheiro da
viagem. Apesar do infortúnio, conseguiu mesmo assim embarcar para os Estados
Unidos.
No ano de 1874, chegava a
Nova York, portando apenas quatro centavos no bolso e a carta de recomendação.
Tesla obteve seu primeiro emprego na famosa usina elétrica de Edison, que,
havia dois anos, iluminava algumas centenas de edifícios de Nova York. Como
todas as usinas daquela época, esta central operava usando corrente contínua,
que podia ser transmitida apenas a curtas distâncias.
No início, Edison encarregou
o imigrante para executar tarefas sujas e pesadas. Mas a inteligência brilhante
de Tesla arrancou a seguinte confissão do patrão: “este estrangeiro é um
engenheiro de primeira plana”.
Tesla registrou em seu nome
uma série de patentes, e cerca de um ano mais tarde montou seu laboratório
particular, para a construção de motores de indução. Tesla sabia que seu motor
de corrente alternada podia funcionar com transmissões a grandes distâncias. Em
1788 apresentou ao Instituto Americano de Engenheiros Electrotécnicos uma tese
que gerou grande polêmica. Poucas pessoas aceitaram seus argumentos de que a corrente
alternada era a chave para a expansão da energia elétrica. George Westinghouse
foi exceção e resolveu adquirir o direito das patentes de Tesla, além de
contratá-lo para dirigir a construção dos novos motores e geradores de corrente
alternada.
A partir daí entrava em
curso a guerra das correntes. Edison, que era uma espécie de supervilão da
ciência, um empresário ultraganancioso que submetia tudo à sua sede de lucro,
empregou dos meios mais inescrupulosos, como experiências cruéis com animais,
para conseguir medidas legislativas que proibissem o uso da corrente alternada.
Outras pessoas, provavelmente pagas por Edison, também lembraram que a corrente
alternada estava sendo usada na nova cadeira elétrica e que sua transmissão em
fios elétricos constituiria certamente uma ameaça à população. Tesla deu a esta
última acusação uma resposta teatral, fazendo com que passassem através de seu
corpo uma corrente de 1.000.000 volts, produzindo uma cena memorável, digna de
ficção científica.
O primeiro grande triunfo de
Tesla ocorreu em 1893, quando seus geradores iluminaram intensamente 90 mil
lâmpadas instaladas na Exposição Mundial de Chicago. Enfim, os inimigos da
corrente alternada jogaram a toalha três anos depois, quando os novos geradores
de grande potência desenhados por Tesla e instalados nas Cataratas do Niágara
começaram a iluminar a cidade de Buffalo, a cerca de 36 km de distância. Tesla
venceu a guerra das correntes.
Dono de um gênio tão
universal como o de Leonardo da Vinci, Tesla foi muito versátil em várias áreas
do conhecimento científico. Fez experiências com iluminação elétrica em tubos
de gás, que foram precursores das lâmpadas de neon e luz fluorescente.
Descobriu o efeito térmico que produzem no corpo humano as ondas curtas e
sugeriu sua aplicação em certos métodos terapêuticos. Em 1793, Tesla anunciou o
princípio da sintonização do rádio e realizou várias experiências com telégrafos
sem fio. Em 1698, Tesla assombrou Nova York com um barco misterioso que
navegava sem tripulação a bordo. Tratava-se de seu famoso barco comandado por
controle remoto. Uma de suas invenções mais notáveis foi a famosa bobina de
Tesla.
A obseção de Tesla, no
entanto, era a transmissão de energia elétrica pelo “éter”, isto é, sem fios
condutores. Com o apoio financeiro de John Jacob Astor, construiu um
laboratório misterioso nas montanhas do estado de Colorado. E se bem que não
existem documentos sobre as experiências, anunciou que tinha conseguido acender
lâmpadas e acionar pequenos motores há mais de 24 km de distância do
laboratório.
Na velhice, Tesla se tornou
um recluso excêntrico e adquiriu uma estranha paixão por pombos. Durante anos, era
visto, sempre vestido de preto, com sua figura austera, transportando um
saquinho de sementes, no parque Bryant ou nos degraus da Catedral de São
Patrício, para alimentar seus estimados pássaros. Nada, porém, que desabonasse
um dos maiores gênios da humanidade de todos os tempos: o formidável Nikola
Tesla!
H.M.
Pode se dizer que o disco (CD) “Rebelião Adolescente” da banda Fecaloma é um marco na história do punk nacional, já que foi o primeiro, com uma tiragem de mil cópias, a trazer estampado o preço na capa – R$ 3,00 reais, o que equivalia, na época, a um dólar. Ademais, no encarte, a banda inusitadamente fazia uma prestação de contas, discriminando os custos de gravação, arte, prensagem etc., e que demonstrava o quanto era barato a produção de um CD independente – que era vendido pelo preço de 10 a 20 reais. (Bandas do mainstream chegavam a vender por 40 reais ou mais).
Embora incomum no Brasil, a
prática surgiu nos anos 80 como uma reação à campanha antipirataria encampada
pela indústria fonográfica, que, àquela altura, mirava suas munições contra a
fita cassete, através da declaração de guerra: “A gravação caseira está
acabando com a música – e é ilegal”. Muitas bandas e fanzines parodiaram o
slogan. A banda anarcopunk holandesa The Ex acrescentou na advertência das
gravadoras o sugestivo: “já não era sem tempo!”. A versão em cassete do EP In
God We Trust, Inc, de 1981, do lendário Dead Kennedys, deixava virgem o lado B
da fita, que vinha com a seguinte inscrição: “A gravação caseira está acabando
com os lucros da indústria de discos!”, portanto, “deixamos um lado virgem para
você fazer a sua parte”. Estampas de camiseta da banda punk californiana Rocket
from the Crypt também alertavam, em tom sarcástico: “A gravação caseira está
acabando com a indústria musical – e daí?!!!”. Porém, ainda mais emblemático
foi o álbum Workers Playtime, de 1988, do compositor inglês de folk music e
punk rock, Billy Bragg, que, além da mensagem “o capitalismo está acabando com
a música”, fixava na capa o preço do disco em £ 4,99 e, logo abaixo, “não pague
mais”.
Curiosamente, a iniciativa
do Fecaloma não foi muito bem recebida na cena punk brasileira, sendo,
inclusive, objeto de crítica. Um país pobre como o Brasil, vai entender...
Em homenagem aos 20 anos do
lançamento do CD “Rebelião adolescente”, transcrevemos aqui integralmente o
texto impresso na sua contracapa:
Rebelião
adolescente
Não
fiz 18 anos, não sou maior de idade, não fiz 21 anos, não alcancei a maioridade
civil, deixem-me envelhecer dignamente. O que esperam de mim, que
arrume um emprego, que passe 10 horas numa firma, saia para almoçar num
restaurante self-service com um bando de chatos, entre numa faculdade, repita
como um papagaio estúpido palavras do tipo mercado de trabalho, campo profissional,
capacitação, (...), vista roupas sociais, beba cerveja com os amigos, fume um
baseado, comprei um carro, um celular, tenha no bolso mil cartões de créditos,
de banco, seguro de vida? Não mesmo! Não vou me corromper. Querem que eu faça
parte da Ordem, que renuncie
todas as minhas aspirações, esperanças, sonhos e utopias. Nunca! Não vou me
render, desistir dos planos de rebelião da minha adolescência. Odeio arrogância
do mundo adulto, a sua seriedade e má-fé. Odeio a frieza e a indiferença dos
adultos, seu calculismo e desrespeito. Onde está aquele mundo de fantasia que
me prometeram? Não existe. Só que eu acreditei. Por que me ocultar na verdade?
Quando eu era criança nem a verdade podia destruir a minha felicidade, então
porque não me disseram tudo? Não sou de guardar ressentimentos, mas não me
obriguem a fazer parte do sistema. A minha adolescência é eterna, e a essência da
minha revolta e crença na liberdade, a minha recusa ao mundo adulto. Conclamo a
todos os adolescentes, à rebelião! À rebelião!
Não tenho medo das
autoridades que me vigiam o tempo todo e me tratam como suspeito. Sou suspeito,
sim, sou inimigo da sociedade, que é conivente a toda injustiça e crimes
praticados pela ordem estabelecida. A hipocrisia das autoridades não me engana,
sou seu eterno inimigo. Estou armado com ideias mais explosivas que mil
dinamites juntas. Querem que eu faça 18 anos logo, para que assim eu possa
responder penalmente, e justificarem com o meu “consentimento” uma eventual
prisão. Mas não sou um criminoso comum, sou um revolucionário. Meu inimigo não
são as pessoas humildes, estes são os das autoridades; meu inimigo é a ordem.
Tenho espírito adolescente, a confusão não me é estranha, o tumulto é
divertido, a esperança é um sonho. À
rebelião, adolescentes! À rebelião!
Sou inconformado com este
mundo corrupto, se envelhecer é corromper-se, então eu não quero envelhecer.
Não vou fazer 21 anos, conquistar minha Independência civil e oficializar a
desonestidade. Jamais! Não quero sentir vergonha do passado, e quando eu
estiver maduro arrepender-me de qualquer ato de covardia. Sou um
revolucionário, não concordo com a indignidade e traição dos adultos que se
entregam sem a menor resistência ao sistema. Entregam-se ao mercado de
trabalho, ao campo profissional, à capacitação, à hipocrisia, sem sequer se
importarem com o destino sombrio das milhares de pessoas excluídas da ordem.
Não, sou um adolescente, detesto o trabalho como odeio a escola, amo a
liberdade como adoro o recreio. Quero viver no futuro próximo, no mundo
igualitário e livre, sem governo sem patrão. Conclamo à revolta, adolescentes!
À rebelião!
Fecaloma
Começo do século XXI (2001).
Mais raro do que um verdadeiro amor é a verdadeira amizade. Durante nossas vidas, muitas pessoas se aproximam de nós, quase sempre, movidas por algum interesse. Na maioria das vezes, isso não é ruim, sendo, a bem dizer, muito natural. Interesses comuns unem as pessoas e podem ser dos mais variados, desde o gosto por literatura até culinária, cinema, música, esporte etc. As falsas amizades, no entanto, nascem de interesses dissimétricos. Explico: quando alguém se aproxima de outro visando tirar algum benefício ou alguma vantagem, geralmente, em torno do dinheiro. Distinguir os falsos amigos dos verdadeiros nem sempre é tarefa fácil, portanto. Certo é que o convívio acaba necessariamente por desmascarar as amizades interesseiras. Todavia, a verdade é que, passando os anos, a maioria das amizades se desfaz e os amigos de ocasião seguem caminhos distintos, tornando-se pessoas distantes e, às vezes, até estranhas. Somente aquelas amizades que resistem ao tempo e à distância são propriamente amizades autênticas. Se acabarem, é porque não eram verdadeiras e decorriam de circunstância muito específica, em que a amizade surgiu como uma consequência. Por outro lado, a amizade é a toda hora posta à prova e a mais decisiva delas aparece nos momentos de dificuldade. É nas horas difíceis que se descobrem os verdadeiros amigos e que eles, lamento dizer, não são muitos – talvez, em alguns casos, sequer existem. Mas, como diria o famoso orador romano Cícero, não se vive sem amizade. Por isso, separei alguns fragmentos da obra de Cícero Da Amizade para ajudar-nos a descobrir, como critério de qualidade, se a pessoa que se diz seu amigo ou sua amiga sente de fato por você uma amizade sincera:
“Também apelo para a autoridade daquele que o
oráculo de Apolo tinha julgado como ‘o mais sábio’. Não um sábio que ora afirma
uma coisa, ora nega, como, aliás, é encontradiço, mas o sábio que sempre afirma
que as almas dos seres humanos são divinas e, quando deixam o corpo, caminham
de retorno para o céu, onde os melhores e os mais justos são, de imediato,
transferidos.
“Quem deposita na virtude o sumo bem, age, sim, de
modo dignificante, uma vez que é a virtude mesma a produzir e a conservar a
amizade, de modo que, sem virtude, não há como existir amizade.
“Graças à amizade, os ausentes tornam-se presentes,
os carentes ficam saciados, os fracos, fortalecidos.
“Não existe, com efeito, maior peste contra a
amizade do que a cobiça de riqueza que afeta a maioria das pessoas. Entre os
melhores explode a concorrência aos postos de honra e glória. Daí advém, entre
pessoas ligadas até por estreita amizade, irreconciliáveis desavenças.
“Por conseguinte, não há como escusar um crime pelo
fato de ter sido praticado em favor do amigo.
“Não devemos dar ouvidos àqueles que fazem da
virtude algo duro e férreo. Na verdade, ela é, em muitas situações, quer na
amizade, quer em muitas outras propriedades de caráter, tanto tenra quanto
flexível de modo a difundir doçura sobre os amigos, enquanto ameniza qualquer
mal-estar.
“Portanto, não é a amizade que acompanha a
utilidade e, sim, a utilidade que segue a amizade.
“Quem iria amar uma pessoa que inspira medo? Tais
indivíduos são respeitados de modo dissimulado, só por algum tempo. Se ocorre a
queda do poder deles, como de fato acontece, então fica visível como eram
vazios de amizade.
“Eis porque a verdadeira amizade, dificilmente, é
encontrada naqueles que vivem das honras dos cargos públicos. Onde, entre eles,
encontrar quem anteponha a honra do amigo à sua própria? Para omitir o mais,
apenas acrescento: como é penoso e difícil para a maioria, partilhar das
desgraças do amigo!
“Ainda que Ênio, com razão, editasse: ‘Conhece-se o
amigo certo nas horas incertas’.
“Na amizade, um dos aspectos mais relevantes é que
o maior iguala-se ao menor.
“Assim amam os amigos tal como gado, já que sempre
esperam tirar algum proveito. (Falsa amizade)
“Cada qual se ama a si mesmo não porque retira
disso algum preço e, sim, porque cada um em si é caro para si mesmo.
“Ambos esses vocábulos (amor e amizade) derivam de
‘amar’. Amar, outra coisa não é senão estimar a quem se quer bem, sem cálculo e
interesse ou de vantagem.
“A vantagem, mesmo que não a procures, ela aflora,
espontaneamente, da amizade.
“Como as coisas humanas são frágeis e caducas,
devemos, sempre buscar a quem amamos e que nos ame porque, tirando da vida o
afeto e a benevolência, a vida perde todo o seu encanto.”
(Cícero, Da
Amizade, tradução de Luiz Feracine, Editora Escala, 2006)
*****
Marco Túlio Cícero foi advogado, filósofo, orador,
retórico e político romano. Apesar da origem plebeia, da gens Túlia, sua família
era rica. Cícero fez fortuna ao defender numerosas causas que lhe deram prestígio
e o conduziram a altos cargos na República Romana. No ano de 76 a.C., foi
questor na Cicília; pretor, em 66; e cônsul em 62. Tornaram-se célebres seus
discursos, denominados Catilinárias, contra a conspiração tramada pelo senador Lúcio
Sérgio Catilina. Durante a guerra civil, entre os anos de 51 e 50, foi
governador da Cicília, tornando-se apoiador de Cneu Pompeu Magno, adversário de
Caio Júlio César. Após o atentado contra a vida de César, as desavenças com Marco
Antônio, partidário daquele, levaram ao assassinato de Cícero em Fórmica. Merecem
menção, entre outras, as suas obras “Do orador”, “Da República”, “Das Leis”, “Dos
deveres”, “Controvérsias Tusculanas”, “Sobre a Natureza dos Deuses”, “Da
Velhice”, “Da Adivinhação”, “Cartas” e “Da Amizade”.
Ike Turner nasceu em uma família pobre e religiosa, na cidade Clarksdale, Mississippi, em 5 de novembro de 1931. O racismo característico dos estados sulistas dos EUA propiciou um acontecimento trágico em sua vida: seu pai foi espancado até a morte por uma multidão de pessoas brancas.
Ike e Tina Turner |
Apesar dos infortúnios da
condição de afrodescendente em uma sociedade conservadora e preconceituosa, ainda
criança revelou um talento excepcional para música, que lhe rendeu um emprego
de DJ numa rádio local. O garoto havia aprendido a tocar piano com o mestre do
boogie-woogie, Pinetop Perkins, e foi um autodidata com a guitarra, tornando-se
virtuose com o instrumento.
Na adolescência, montou a
sua própria banda, The Rhythm Kings, que o acompanhou por toda a sua carreira.
Em 1951, gravou “Rocket 88”, canção creditada a Jackie Brenston and His Delta
Cats e considerada o primeiro registro da história no gênero rock’n’roll.
Ike também trabalhou como caça-talentos.
Ajudou a “descobrir” astros da grandeza de BB King, Bobby “Blue” Bland, Roscoe
Gordon e Little Milton.
Antes mesmo de completar 25
anos, Ike chegou a se casar oito vezes, ou talvez mais. Quando Anna Mae Bullock,
sua terceira esposa e mais conhecida como Tina Turner, entrou para a banda e
assumiu o piano, Ike foi tocar guitarra, desenvolvendo um estilo próprio e
potente. Jimi Hendrix chegou a dizer que Ike era o melhor guitarrista de rhythm
and blues de todos os tempos.
Ike cruzou o país, fazendo
shows com sua banda. Ele se recusava a se apresentar para públicos segregados,
como era costume naquele tempo, e exigia, mesmo no sul, que o público fosse
misturado.
Mais tarde, Tina se
divorciou de Ike alegando que sofria espancamento e que o marido, além de
viciado em cocaína, era infiel no casamento. Mas, em que pese o insucesso no
casamento, Ike e Tina Turner foram incluídos no Rock and Roll Hall of Fame, em
1991.
A Revolução dos Cravos ou Revolução de 25 de Abril foi um movimento
militar ocorrido em 1974, que surgiu no contexto das guerras coloniais que
Portugal mantinha na África desde o início dos anos 60. O movimento, que
transcorreu praticamente sem violência, derrubou o regime ditatorial do Estado
Novo, instaurado por Antônio Salazar e continuado por Marcelo Caetano. A
revolução teve como protagonistas jovens oficiais, os chamados "capitães
de abril", que foram veteranos das campanhas na África. Durante os
acontecimentos, os soldados recebiam, como sinal de apoio, cravos vermelhos da
população. Segue trecho da obra de Saramago Levantado do chão: romance que descreve o Primeiro de Maio durante a revolução e o poema de José Afonso Grândola, Vila Morena:
*****
Em Abril, falas mil. Nos
campos há grandes ajuntamentos noturnos, os homens mal veem as caras uns dos
outros, mas ouvem-se-lhes as vozes, abafadas se o local não é de suficiente segurança,
ou mais soltas e claras em deserto, em todos os casos com a proteção de vigias,
dispostos segundo a arte estratégica da prevenção, como quem defende um
acampamento. É, deste lado, uma guerra pacífica. Se pelo escuro da noite a
guarda se aproxima, e agora já não é a simples patrulha de dois homens dos
tempos correntes, vêm às dúzias e meias dúzias, e até onde os carreteiros
chegam transportam-se em jipe e jipão, se vindo assim se aproximam, depois em linha,
como quem levanta caça, recuam as sentinelas a avisar, e então de duas uma,
consoante, ou a guarda vai passar de largo e o silêncio é a melhor defesa,
todos os homens, sentados ou de pé, seguram a respiração e os pensamentos, são
direitas pedras, antas doutro tempo, ou a guarda vem mesmo ao direito da
reunião e a ordem é dispersar por caminhos de mau piso, por enquanto ainda a
guarda não tem cães, é o que vale. Na noite seguinte prosseguirá a conversa no
ponto em que foi deixada, naquele mesmo lugar ou noutro, que esta paciência é
infinita. E quando é possível encontram-se de dia, em grupos mais pequenos, ou
vão pelas casas, conversa de ao pé do lume, enquanto as mulheres lavam a louça
caladas e as crianças adormecem pelos cantos. E estando no eito um homem ao pé
doutro homem, a palavra dita e ouvida é como o bater do maço da cabrilha na
estaca, mais funda um pouco, e na hora de comer, com a panelinha ou a marmita
pousadas no chão, entre as pernas, enquanto a colher sobe e desce e a aragem
fria vai arrefecendo o corpo, tornam as palavras ao de cima, é um falar pausado
que diz, Vamos para as oito horas, basta de trabalhar de sol a sol, e então os
prudentes temem-se do futuro, Que será de nós se os patrões não quiserem dar
trabalho, mas as mulheres que estão a lavar a loiça da ceia, enquanto o lume
arde, têm vergonha de que tão prudente o seu homem seja e estão de acordo com o
amigo que lhes bateu à porta para dizer, Vamos para as oito horas, basta de
trabalhar de sol a sol, porque também elas assim trabalham, e mais ainda,
doridas, menstruadas, pejadas da barriga à boca, ou, quando já não, com os
seios a derramar o leite que devia ter sido mamado, é uma sorte, não se lhes
secou, muito se engana pois quem julgue que basta levantar uma bandeira e
dizer, Vamos. É preciso que Abril seja um mês de palavras mil, porque mesmo os
certos e convencidos têm seus momentos de dúvida, suas agonias e desânimos, lá
está a guarda, lá estão os dragões da pide, e a negra sombra que alastra pelo
latifúndio, que nunca o abandona, não há trabalho, e vamos nós, por nossas
mãos, acordar a besta que dorme, sacudi-la e dizer, Amanhã, só trabalharei oito
horas, isto não é o primeiro de Maio, o primeiro de Maio é o menos, ninguém
pode obrigar-me a ir trabalhar, mas se eu disser, Oito horas, só isto e nada
mais, é como açular o cão raivoso. E o amigo diz, aqui sentado no cortiço, ou
ao meu lado no eito, ou no meio de uma noite tão escura que nem posso ver-lhe a
cara, Não se trata só das oito horas, vamos também reclamar quarenta escudos de
salário, se não quisermos morrer de canseira e de fome, são boas coisas de
pedir e de fazer, o difícil é tê-las. O que vale é que sendo as falas muitas,
muitas são as vozes, e do ajuntamento levanta-se uma, não é simples modo de
dizer, é verdade, há vozes que se põem de pé, Que vida tem sido a nossa, em
dois anos morreram-me dois filhos da doença da fome, e aquele que me resta,
irei criá-lo para besta de carga, respondam-me, se nem eu quero continuar a ser
a besta de carga que sou, são palavras que ferem os ouvidos delicados, mas aqui
não os há, ainda que ninguém, deste ajuntamento, goste de olhar para o espelho
e ver-se metido em varais de carroça ou com albarda e cangas, É assim desde que
nascemos.
(...)
E então começa-se a falar no
primeiro de Maio, é uma conversa que todos os anos se repete, mas agora é um
alvoroço público, lembrar-se a gente de que ainda o ano passado andava a
esconder-se por aí, para combinar, organizar, era preciso voltar constantemente
ao princípio, ligar os de confiança, animar os indecisos, tranquilizar os
temerosos, e mesmo agora ainda há quem não acredite que a festa do primeiro de
Maio possa ser às claras como dizem os jornais, quando a esmola é grande, o
pobre desconfia. Não é esmola nenhuma, declaram Sigismundo Canastro e Manuel
Espada, desdobra-se um jornal de Lisboa, Está aqui escrito que o primeiro de
Maio será festejado livremente, e dia feriado em todo o país, E então a guarda,
insistem os de boa memória, A guarda desta vez fica a ver-nos passar, quem
havia de dizer que uma coisa assim nos viria a acontecer um dia, a guarda
quieta e calada enquanto tu gritas viva o primeiro de Maio.
E como por cima daquilo que
nos permitem temos sempre de pôr o que imaginamos, ou então não somos homens
merecedores de pão cozido, principiou a dizer-se que toda a gente devia
estender colchas à janela e pôr flores, como se fosse dia de sair o Senhor dos
Passos à praça, com um pouco mais se varriam as ruas e embarracavam as casas,
tão fáceis são de subir as escadas do contentamento. Porém, assim são os dramas
humanos, exagero foi chamar-lhes dramas, mas sem dúvida são perplexidades,
agora que vou eu fazer se em minha casa não há colchas nem tenho jardins de
cravos e rosas, quem terá sido o da ideia. Tem Maria Adelaide parte nesta
ansiedade, mas sendo nova e esperançosa diz à mãe que não poderão ficar em
pouco, que não havendo colcha fará uma toalha as vezes dela, branquíssimo pano
suspenso do postigo da porta, bandeira de paz no latifúndio, homem civil que
ali passasse haveria de descobrir-se com respeito, e sendo guarda ou militar em
sentido e continência prestar homenagem diante da porta de Manuel Espada, trabalhador
e bom homem. E não sejam as flores vosso cuidado, senhora mãe, que à fonte do
Amieiro irei colher das silvestres que neste tempo de Maio cobrem os vales e as
colinas, e estando as laranjeiras floridas ramos dela trarei e assim nosso
postigo será janela enfeitada como varanda de alcácer, menos do que os outros
não seremos, porque somos tanto.
(José
Saramago. Trecho de “Levantado do chão: romance”)
Grândola, Vila Morena
Grândola, Vila Morena
Terra
da fraternidade
O
povo é quem mais ordena
Dentro
de ti, ó cidade
Dentro
de ti, ó cidade
O
povo é quem mais ordena
Terra
da fraternidade
Grândola, Vila Morena
Em
cada esquina, um amigo
Em
cada rosto, igualdade
Grândola, Vila Morena
Terra
da fraternidade
Terra
da fraternidade
Grândola, Vila Morena
Em
cada rosto, igualdade
O povo
é quem mais ordena
À
sombra duma azinheira
Que
já não sabia a idade
Jurei
ter por companheira
Grândola,
a tua vontade
Grândola
a tua vontade
Jurei
ter por companheira
À
sombra duma azinheira
Que
já não sabia a idade
(Canção
de José Afonso)