quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

💔 O Veneno da Dúvida: O Ciúme Patológico como Força Destruidora em Dom Casmurro

A ilustração é uma representação simbólica e sombria do Ciúme Patológico de Bentinho como a força destrutiva central de Dom Casmurro.  No centro, a figura de Bento Santiago (Dom Casmurro) aparece já idoso, sentado em seu gabinete ou na sala que mandou construir idêntica à de sua juventude, envolto em sombras. Ele está isolado e com uma expressão de profunda amargura e paranoia.  O Ciúme como Corrosão: O peito de Bentinho está ligeiramente aberto ou transparente, revelando seu coração. No entanto, o coração não é um órgão vital comum, mas sim um objeto corroído, escurecido e envolto em espinhos ou em fios de arame farpado, simbolizando a doença do ciúme que o destrói por dentro. Deste coração doente, emana uma fumaça escura que turva a visão ao seu redor.  A Visão Distorcida: A fumaça escura de seu ciúme se condensa em uma imagem espectral, pairando no ar. Esta imagem é uma dupla figura – Capitu e Escobar – que se fundem em um único vulto indistinto, mas que é o foco da sua obsessão. A imagem não é clara, mas distorcida e carregada de malícia na percepção de Bentinho, ilustrando como o ciúme patológico cria a "verdade" onde ela pode não existir.  O Isolamento: O ambiente está frio, escuro e vazio, com objetos quebrados ou em desordem, simbolizando o casamento destruído e a solidão a que Bentinho se condena. A única luz na cena é uma luz fraca, quase fantasmagórica, que ilumina o vulto espectral, mostrando que a única coisa que resta na vida do narrador é a sua obsessão ciumenta.  A composição inteira ilustra o tema de que o ciúme é mais destrutivo do que a traição, pois ele é a força que consome o emissor e distorce a realidade para justificar a sua própria dor.

Dom Casmurro (1899), de Machado de Assis, é universalmente aclamado como um dos maiores enigmas da literatura. Embora a pergunta "Capitu traiu ou não traiu?" permaneça em aberto, o verdadeiro motor da tragédia do romance não é o fato consumado, mas sim o ciúme patológico de Bento Santiago (o narrador, Dom Casmurro). É a doença da desconfiança que corrói o amor, destrói o casamento e, em última instância, condena Capitu ao exílio e à desgraça.

Este artigo se dedica a analisar como o ciúme doentio de Bentinho atua como o principal agente destruidor na trajetória do casal. Exploraremos as manifestações dessa paranoia, o seu papel em transformar a memória e a percepção, e o modo como o ciúme se torna a única certeza em um romance onde a verdade é inatingível.

🔥 A Semente da Desconfiança

O ciúme em Dom Casmurro não surge de repente; ele é uma semente plantada na infância de Bentinho e nutrida por sua personalidade possessiva, insegura e melancólica.

A Origem da Insegurança

Bentinho é o filho único e herdeiro de uma família rica, excessivamente mimado e protegido, o que o torna frágil e dependente emocionalmente.

  1. Possessividade Infantil: Desde cedo, Bentinho manifesta uma possessividade obsessiva por Capitu, querendo que ela se dedique apenas a ele.

  2. Ameaça Externa: A promessa de que ele seria padre, feita por sua mãe, Dona Glória, cria uma insegurança fundamental em seu futuro com Capitu.

  3. O Espelho Escobar: Escobar, o amigo de seminário, é o oposto de Bentinho: forte, decidido, empreendedor e socialmente adaptado. Bentinho projeta em Escobar tudo o que ele teme não ser e, consequentemente, vê-o como uma ameaça existencial.

O ciúme, assim, é menos sobre o amor de Capitu por outro homem e mais sobre a insegurança de Bentinho sobre seu próprio valor e capacidade de reter a mulher forte e ambiciosa que ele desposou.

🔬 O Ciúme Patológico como Corrosão

O ciúme de Bentinho transcende a mera insegurança e atinge a esfera da patologia – uma doença mental que distorce a realidade e se alimenta de si mesma.

A Destruição da Percepção e da Memória

O poder destrutivo do ciúme manifesta-se no modo como ele corrói a percepção e a memória do narrador. Bentinho, já idoso (Dom Casmurro), revisita o passado não para recordá-lo, mas para prová-lo à luz de sua crença na traição.

  • Reinterpretação Retroativa: Gestos inocentes da juventude de Capitu são relidos como "sinais precursores" de sua futura dissimulação. O ciúme transforma a história.

  • O Incidente do Cavalos: O ciúme se manifesta em pequenos atos de paranoia, como quando Bentinho imagina que o cavalo que Escobar comprou se parece com Capitu e Ezequiel, uma clara projeção de sua obsessão.

  • O Foco Obsessivo: A visão do caixão de Escobar e o choro de Capitu no velório tornam-se o ponto de virada, o momento em que a dúvida é transformada em certeza patológica através de uma única observação emocionalmente enviesada.

"O ciúme é um monstro que se alimenta do que não vê e cria a verdade onde ela não existe."

O Ciúme como Única Certeza

O enigma da traição reside na ambiguidade criada pelo narrador não confiável. A única coisa que o leitor tem certeza é da natureza avassaladora e destrutiva do ciúme de Bentinho.

A tragédia do romance não é a dúvida, mas o fato de que o ciúme de Bentinho, ao se tornar dogmático, destrói o que era real e belo. Ele transforma o amor em ódio e a dúvida em condenação.

💥 O Desfecho da Destruição Familiar

O ápice do poder destrutivo do ciúme patológico é o desmantelamento da família. A paranoia de Bentinho não se limita à esposa; ela se estende ao filho, Ezequiel, cuja semelhança com Escobar torna-se a "prova cabal" da traição.

A Condenação de Capitu e Ezequiel

Ao ter a certeza (na sua mente doentia) da traição, Bentinho tenta envenenar-se, mas falha. O seu passo seguinte é a destruição ativa:

  1. Separação e Exílio: Bentinho impõe o exílio de Capitu e Ezequiel para a Suíça e, posteriormente, para a Itália. Ele não a perdoa, nem a confronta com evidências objetivas; ele a elimina da sua vida e da narrativa social, garantindo a vitória de sua versão da história.

  2. Rejeição do Filho: A rejeição de Ezequiel é o ato mais cruel do ciúme. Bentinho não consegue ver em Ezequiel o filho do seu casamento, mas sim o símbolo vivo da sua humilhação.

A tragédia, portanto, não é a suposta traição em si, mas as consequências do ciúme de Bentinho: a destruição do laço afetivo, a solidão final de Dom Casmurro e a condenação de Capitu e do filho.

❓ Perguntas Comuns sobre o Ciúme em Dom Casmurro

Se a traição fosse provada, o ciúme de Bentinho seria justificado?

Não. Mesmo que a traição fosse real, o ciúme de Bentinho manifesta-se de forma patológica muito antes de qualquer evidência (e mesmo sem ela). Ele usa o ciúme para corroer o casamento a partir de dentro, e a intensidade e o caráter destrutivo de sua reação (exílio, rejeição do filho) são desproporcionais, caracterizando a doença, não a mera reação.

O ciúme de Bentinho é um retrato da sociedade patriarcal?

Sim. O ciúme em Dom Casmurro reflete a mentalidade patriarcal da época. Bentinho não se sente apenas traído; sente-se desapossado do que considera ser sua propriedade (Capitu). O ciúme é exacerbado pela sua incapacidade de controlar a mente e a ambição de Capitu, uma mulher que desafiava os padrões femininos da submissão.

Por que Machado de Assis não resolve o enigma da traição?

Machado não resolve o enigma porque o foco do romance não é a traição, mas o mecanismo do ciúme e da memória. Ao deixar a dúvida em aberto, o autor obriga o leitor a analisar o narrador (Bentinho) e a forma como o ciúme destrói a percepção da realidade, provando que a doença da alma é mais destrutiva do que qualquer fato externo.

🗝️ Conclusão: O Legado do Destruidor

Dom Casmurro é uma obra imortal porque transcende o drama de um adultério potencial para se firmar como um estudo profundo do ciúme patológico. A trajetória do casal Bentinho e Capitu é a prova literária de que o maior inimigo do amor não é a traição, mas a desconfiança cega e a insegurança doentia.

Ao se fechar no seu próprio mundo de suspeitas, Dom Casmurro destrói não apenas a esposa e o filho, mas a si mesmo, condenando-se a uma velhice solitária, onde a única companhia é a sua memória amarga e a sua versão inabalável da tragédia.

(*) Notas sobre a ilustração:

A ilustração é uma representação simbólica e sombria do Ciúme Patológico de Bentinho como a força destrutiva central de Dom Casmurro.

No centro, a figura de Bento Santiago (Dom Casmurro) aparece já idoso, sentado em seu gabinete ou na sala que mandou construir idêntica à de sua juventude, envolto em sombras. Ele está isolado e com uma expressão de profunda amargura e paranoia.

  • O Ciúme como Corrosão: O peito de Bentinho está ligeiramente aberto ou transparente, revelando seu coração. No entanto, o coração não é um órgão vital comum, mas sim um objeto corroído, escurecido e envolto em espinhos ou em fios de arame farpado, simbolizando a doença do ciúme que o destrói por dentro. Deste coração doente, emana uma fumaça escura que turva a visão ao seu redor.

  • A Visão Distorcida: A fumaça escura de seu ciúme se condensa em uma imagem espectral, pairando no ar. Esta imagem é uma dupla figuraCapitu e Escobar – que se fundem em um único vulto indistinto, mas que é o foco da sua obsessão. A imagem não é clara, mas distorcida e carregada de malícia na percepção de Bentinho, ilustrando como o ciúme patológico cria a "verdade" onde ela pode não existir.

  • O Isolamento: O ambiente está frio, escuro e vazio, com objetos quebrados ou em desordem, simbolizando o casamento destruído e a solidão a que Bentinho se condena. A única luz na cena é uma luz fraca, quase fantasmagórica, que ilumina o vulto espectral, mostrando que a única coisa que resta na vida do narrador é a sua obsessão ciumenta.

A composição inteira ilustra o tema de que o ciúme é mais destrutivo do que a traição, pois ele é a força que consome o emissor e distorce a realidade para justificar a sua própria dor.

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